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segunda-feira, 22 de abril de 2013

Deus é fiel...no que isto importa?



por: José Augusto de Oliveira Maia
21/04/2013


O CONCEITO DE FIDELIDADE


Para falar sobre a fidelidade de Deus, gostaria primeiro de verificar o significado da palavra "fidelidade", conforme um dicionário simples; segundo o Michaelis (michaelis.uol.com.br), fidelidade significa "qualidade de quem é fiel; lealdade; semelhança entre o original e a cópia; afeição constante (a fidelidade do cão); probidade, exatidão, pontualidade."

Ok, não há um significado único para a palavra "fidelidade"; mas é possível perceber que o sentido geral do termo pressupõe uma referência: aquilo (ou aquele) que é fiel, é fiel a alguma coisa, ou a alguém, ou a algum princípio. E, partindo deste pressuposto, só podemos afirmar se algo ou alguém é fiel, quando conhecemos sua referência.

Como exemplos disto podemos citar:

* a cópia de um documento é fiel se for exatamente igual ao documento original

* um quadro é fiel se for a representação exata do que foi pintado ali

* uma narrativa é fiel se expressar os fatos como ocorridos na realidade

O TEXTO BÍBLICO


Então, gostaria agora que olhássemos para o texto bíblico de II Timóteo 2:11 - 13 (NVI): "Esta palavra é digna de confiança: se morremos com ele, com ele também viveremos; se perseveramos, com ele também reinaremos. Se o negamos, ele também nos negará; se somos infiéis, ele permanece fiel, pois não pode negar-se a si mesmo."

O apóstolo Paulo escreve da prisão esta segunda carta ao pastor da igreja de Éfeso, Timóteo, e inicia em 1:3 - 5 com um louvor a Deus pela memória da fé e prática de Timóteo; em 1:6 - 14, exorta-o a que permaneça fiel a Deus e a pregação do Evangelho, apesar dos sofrimentos; em 1:15 - 18, Paulo cita o caso daqueles que o abandonaram em virtude de sua prisão, como Fígelo e Hermógenes, bem como aqueles que o apoiaram em Roma, como Onesíforo, dos cristãos de Éfeso. 

Em 2:1 - 10, Paulo continua sua exortação, usando ilustrações como o soldado, o atleta e o agricultor, resgatando a pessoa de Cristo como cerne do Evangelho; e finalmente, em 2:11 - 13, chega ao texto que transcrevemos acima, como um estímulo à perseverança na fidelidade a Deus.

O trecho que destacamos esconde uma aparente contradição: se Deus nos negará se o negarmos, como ele pode permanecer fiel quando formos infiéis? Que maior infidelidade do que a negação, a rejeição a alguém? Como Deus pode nos negar, e ao mesmo tempo, permanecer fiel diante de nossa infidelidade?

AVALIANDO A FIDELIDADE DE DEUS


Então, vamos descobrir o parâmetro para avaliarmos a fidelidade de Deus; a que Deus é fiel?

Há uma riqueza enorme de textos em Isaías sobre Deus, para os quais gostaria que nos voltássemos agora - Isaías 40:18 - 26; 42:8; 44:6 - 8; 45:5, 6, 21, 22; 46:5 - 7.

Nestes textos, Isaías pergunta a Israel com quem eles querem comparar Deus; mostra as diferenças entre as imagens de fundição, e o Deus Criador de todo o Universo; Aquele que é tão ÚNICO, que "reduz a nada os juízes deste mundo", e chama cada estrela pelo seu nome, e "nehuma delas deixa de comparecer.".  Por isso Ele mesmo diz que não dará a outro o louvor que só a Ele é devido. À pergunta "Há outro Deus além de mim?", Ele mesmo responde, "Não, não existe nenhuma outra Rocha; não conheço nenhuma.". Toda Sua criação O reconhece como único, e que não há salvador além d'Ele.

Portanto, como Deus não tem igual, só há um parâmetro para avaliarmos a fidelidade de Deus, e este parâmetro, é Ele mesmo! Se Deus permanece fiel pois não pode negar a si mesmo, então Ele é sempre fiel...a si mesmo.

AS PROMESSAS DE DEUS - O TESTE DE SUA FIDELIDADE


O profeta Jeremias nos dá o tom da fidelidade de Deus, em Jeremias 1:11 e 12: "E a palavra do Senhor veio a mim: 'O que você vê, Jeremias?' 'Vejo o ramo de uma amendoeira', respondi. O Senhor me disse: 'Você viu bem, pois estou vigiando para que a minha palavra se cumpra'."

Deus tem em Sua palavra muitas promessas, algumas feitas para uma situação específica na história de Israel, outras que ainda se cumprirão, e outras, relativas à Igreja; o que precisamos destacar aqui é que podemos dividir as promessas de Deus em dois grandes grupos: promessas positivas, e promessas negativas.

O capítulo 28 de Deuteronômio nos dá um excelente exemplo disso; ali, pouco antes de a nova geração de Israel atravessar o Jordão e começar a tomar posse de Canaã, ouviram novamente o alerta de Deus: "Se vocês obedecerem fielmente ao Senhor, ao seu Deus, e seguirem cuidadosamente todos os Seus mandamentos que hoje lhes dou, o Senhor, o seu Deus, os colocará muito acima de todas as nações da Terra." (...) "Entretanto, se vocês não obedecerem ao Senhor, ao seu Deus, e não seguirem cuidadosamente todos os Seus mandamentos e decretos que hoje lhes dou, todas estas maldições cairão sobre vocês e lhes atingirão:" (28:1 e 15); às duas promessas, segue uma lista de bençãos ou de maldições, conforme o caso. 

Abaixo, seguem outros exemplos de textos bíblicos com promessas positivas e negativas.

PROMESSAS POSITIVAS                                                                             
Êxodo 15:26

Êxodo 19:5, 6

Levítico 26:3 – 12; 40 – 45

Deuteronômio 5:32, 33

Deuteronômio 7:9

Deuteronômio 11:26, 27

Salmo 128:1 – 4                                                                          
PROMESSAS NEGATIVAS     
Levítico 26:14 - 39

Deuteronômio 7:10

Deuteronômio 11:16, 17

Deuteronômio 11:28

Malaquias 2:1, 2                                 

A QUESTÃO QUE IMPORTA


Finalmente, chegamos então à pergunta-título deste artigo: Deus é fiel...no que isto importa?

Deus não pode entrar em contradição consigo; Ele está preso à Sua palavra, e nisto consiste a fidelidade de Deus. Deus cumprirá Sua palavra, na qual Ele prometeu com todas as letras que salvará todos aqueles que andam com Ele, mas castigará todos os que se entregam ao pecado; disso mesmo falou o apóstolo Paulo aos atenienses: "No passado Deus não levou em conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam. Pois estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio do homem que designou. E deu provas disso a todos, ressuscitando-o dentre os mortos." (Atos 17:30, 31). Este homem é JESUS.

Portanto, da próxima vez que ouvirmos que Deus é fiel, lembremos que isto é verdade, e perguntemos: "E eu, tenho sido fiel  a Deus?" Pois Deus permanecerá sempre fiel. Isto importa a todos nós. 

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terça-feira, 16 de abril de 2013

Dízimo e ofertas - teoria e prática





por: José Augusto de Oliveira Maia
05.01.2013


INTRODUÇÃO

O propósito deste texto é analisar os objetivos da prática do dízimo e das ofertas na Bíblia e na Igreja Primitiva; verificar, ainda que superficialmente, seu impacto ao longo da História do Cristianismo; e lançar um olhar crítico sobre a prática do dízimo hoje. A versão básica adotada do texto bíblico será a Nova Versão Internacional (NVI).

DEFINIÇÃO DO ATO DE DIZIMAR

Dizimar é o ato de doar um décimo de bens ou produtos (em dinheiro ou através de outros recursos); esta doação, em geral, destina-se ao sustento de instituições religiosas ou de uma determinada ordem sacerdotal; historicamente, esta prática perde-se no tempo(1).

ASPECTOS GERAIS DO DÍZIMO NA BÍBLIA E NA IGREJA PRIMITIVA

Tanto no Antigo Testamento (A. T.) quanto no Novo (N. T.), podemos encontrar diversas ocorrências interessantes sobre a prática do dízimo:

a) Abraão deu os dízimos dos despojos da luta contra Quedorlaomer e seus aliados a Melquisedeque (Gênesis 14:17 - 20)

b) Jacó prometeu a Deus o dízimo de tudo o que ganhasse em sua vida (Gênesis 28:20 - 22)

c) Com o advento da Lei mosaica, a prática do dízimo foi regulamentada na vida religiosa do povo de Israel (Deuteronômio 14:22 - 29; 26:1 - 19); diferentes de outros tipos de ofertas, as ofertas descritas na prática do dízimo não tinham como objetivo a expiação pelos pecados(2)

d) A prática do dízimo foi retomada após o exílio babilônico do povo de Judá (Neemias 10:37 - 39; Malaquias 3:10)

e) Em tempos do Novo Testamento, na comunidade judaica pré-cristã e caracterizada pelo farisaismo, a relação entre a prática do dizimo e a espiritualidade do dizimista parecia marcada por uma tensão delicada, a julgarmos pelas palavras de Jesus (Mateus 15:1 - 9; 23:23; Lucas 11:42; 18:9 - 14)

f) Na vida da Igreja Primitiva, os dízimos e ofertas eram praticados frequentemente pelos cristãos (Atos 2:45; 11:27 - 30; I Coríntios 16:1 - 4; II Coríntios caps. 8 e 9)

g) A "Didaqué", texto também conhecido como "O Ensino dos Doze Apóstolos", estipula a prática de ofertas para os professores e mestres que houvesse entre os irmãos; caso não houvesse nenhum, o benefício era estendido aos pobres; as ofertas poderiam ser de vinho, cereais, gado, óleo, pão, dinheiro, roupas e outros bens ("Didaqué", 13:1 - 7)(3)

Durante a Idade Média (476 - 1.453), houve períodos em que o dízimo era coletado diretamente pelo Estado, como no Império Carolíngio (800 - 843); em outros momentos, a Sé Católica, em Roma, dizimava a Igreja Católica em outras nações, o que provocou amargos ressentimentos contra o papado, servindo de estímulo para a Reforma do século XVI(4).

O OBJETIVO DO DÍZIMO NO ANTIGO TESTAMENTO

Analisando os textos de Deuteronômio 14:22 - 29 e 26:1 - 14, observamos o seguinte:


a) o dízimo era dado sobre a produção da terra


b) sobre o gado, a oferta designada era a primeira cria


c) o dízimo e a oferta eram para ser consumidos pelo ofertante e sua família, em uma refeição realizada no local escolhido por Deus para colocar o Seu nome, para aprender a temer ao Senhor


d) o dízimo poderia ser convertido em dinheiro, para facilitar o transporte, caso a residência do ofertante fosse distante do local escolhido por Deus


e) este dinheiro poderia ser usado para comprar diversos gêneros alimentícios para consumo, até mesmo vinho e bebida forte


f) a participação do ofertante e sua família naquela refeição deveria ser feita com alegria


g) a cada três anos, o dízimo deveria ser armazenado em cada cidade, para prover o sustento dos levitas, das viúvas, dos órfãos e dos estrangeiros


h) a participação nestas refeições não deveria ser em períodos de luto; não deveria ser feita em impureza; e nada deveria ser oferecido aos mortos


i) estas celebrações tinham caráter memorativo da fidelidade de Deus no cumprimento de Suas promessas, e de reconhecimento de que, o que recebiam, vinha do Senhor; e estas refeições deveriam ser compartilhadas com os levitas e os estrangeiros


É impressionante o fato de que o dízimo deveria ser consumido pelo próprio ofertante e sua família, como um ato de reconhecimento a Deus por Sua provisão, com grande alegria; a entrega do dízimo não era uma despesa a parte do sustento da família, pois o dízimo era consumido cerimonialmente pela própria família do ofertante; apenas dois fatores tornavam este momento distinguivel das outras refeições familiares (o consumo dos 90% restantes):

a) o primeiro era o fato de o consumo do dízimo ser feito "no local que Deus escolheu como habitação do Seu nome"; isto serviria para ressaltar o caráter de gratidão a Deus que a refeição precisava ter. Por isso mesmo, o momento deveria ser celebrado com alegria, e não poderia ser praticado em períodos de luto

b) o segundo fator de distinção para a prática do dízimo era a preocupação em, através dele, atender-se não só aos levitas, que não tinham propriedade nem herança (Deuteronômio 10:8, 9), mas também aos estrangeiros, órfãos e viúvas, "para que venham comer e saciar-se"; a preocupação com o sustento dos pobres era tão importante quanto o sustento do ofício sacerdotal (interessante pensarmos que isto acabaria com qualquer pretensão de uma classe sacerdotal elitista e privilegiada, como queriam os filhos do sacerdote Eli - I Samuel 2:12 - 17 e 22); por isso mesmo, nada era oferecido aos mortos, pois os mesmos não precisam de sustento, e sim os vivos 

A QUESTÃO DO DÍZIMO E A ESPIRITUALIDADE

Entre outras tantas críticas de Jesus contra os escribas e fariseus, está a observância da entrega do dízimo da hortelã, do endro e do cominho, simultânea à negligência quanto à prática da justiça, da misericórdia e da fé. Para estes grupos, a prática estrita da Lei era sinal de uma espiritualidade amadurecida, em detrimento daqueles que, aos seus olhos, estavam longe de Deus (Lucas 18:9 - 14); para Jesus, no entanto, o filho que honrava os pais suprindo-lhes as necessidades agradava muito mais a Deus do que aquele que trazia suas ofertas (Mateus 15:1 - 9; I Timóteo 5:4, 8); embora Jesus defendesse a prática do dízimo (Mateus 23:23), opunha-se aos que observavam a prática da Lei sem guardar o espírito, o sentido que Deus dava à Lei.

NA IGREJA PRIMITIVA

Na narrativa bíblica sobre o início da Igreja, podemos observar as seguintes características na coleta de dízimos e ofertas entre os primeiros cristãos:

a) o principal objetivo era socorrer os necessitados (Atos 2:45; 11:27 - 30; Romanos 15:26; I Coríntios 16:1 - 4)

b) esta prática era vista como um privilégio (II Coríntios 8:4, 7)

c) era um indicativo de um amor sincero, baseado no exemplo de Cristo (II Coríntios 8:8, 9)

d) a prática deveria acompanhar o discurso, pois a "forte disposição" na prática tornava  a oferta aceitável de acordo com aquilo que o ofertante tinha, independente do valor da oferta (II Coríntios 8:10 - 12)

e) o objetivo desta prática era a igualdade entre os membros da comunidade (II Coríntios 8:13 - 15)

f) a organização prévia também era fundamental (II Coríntios 9:5)

g) a contribuição, à semelhança da prática do dízimo na Lei, deveria ser com alegria, e não maculada pela tristeza (II Coríntios 9:7; Deuteronômio 26:11, 14)

h) a oferta levantada era vista como provisão de Deus (II Coríntios 9:10, 11)

i) sua doação generosa, numa associação fiel entre discurso e prática, redundava em louvor a Deus (II Coríntios 9:12 - 15; Hebreus 13:16)

Apesar de percebermos algum nível de organização operacional na arrecadação de dízimos e ofertas no período da Igreja Primitiva, mais notório é o objetivo para o qual esta coleta era organizada: socorrer os necessitados e promover a igualdade entre os cristãos (é gritante a conexão deste aspecto com a nivelação de levitas e necessitados no tempo do Antigo Testamento, em oposição ao que faziam os filhos de Eli no tempo dos juízes; já a Didaqué, infelizmente, parece ter invertido as prioridades, dando preferência aos mestres e profetas, e na ausência destes, os pobres). Sua conotação espiritual merece destaque, uma vez que era o indicativo de um amor sincero, e ensejava o louvor a Deus, além de ser, por si só, uma prática agradável ao Senhor. Fora isso, vemos a Igreja em Filipos enviando donativos a Paulo em Tessalônica, através de um irmão chamado Epafrodito (Filipenses 4:10 - 19); também podemos ver na comunidade cristã da época a preocupação em prover o sustento daqueles que dirigiam a Igreja e pregavam (Gálatas 6:6; I Tessalonicenses 5:12, 13; I Timóteo  5:17, 18).

DÍZIMOS E OFERTAS NA IDADE MÉDIA

A lamentável associação entre Igreja e Estado, durante a Idade Média, ensejou práticas desvirtuadas em relação à contribuição dos fiéis à Igreja; o enriquecimento de dioceses e monastérios foi uma tentação à vaidade e ambição, diante da qual caíram muitos bispos e monges; esta situação lamentável recebeu oposição principalmente da Ordem Franciscana, fundada em 1.210, cujos ideais de pobreza proclamados por seu fundador, São Francisco de Assis, chocaram-se com um papado cada vez mais rico, motivando a perseguição da Ordem Franciscana pelo papa João XXII (1.316 - 1.334), subordinado aos interesses da coroa francesa durante o chamado Cativeiro Babilônico da Igreja (1.305 - 1.377); contra esta perseguição levantaram-se expoentes desta Ordem, como seu ministro-geral Miguel de Cesena e o teólogo inglês Guilherme de Occam(5).     
      
Ainda durante o Cativeiro Babilônico, a aliança de interesses de Estado da França e do papado de Avignon motivaram a criação de impostos papais para financiar seus objetivos políticos, especialmente durante os primeiros anos da Guerra dos Cem Anos (1.337 - 1.453) entre  França e Inglaterra; podemos destacar a anata, imposto cobrado durante o primeiro ano de cada prelado que assumia a direção de um estabelecimento da Igreja; esta cobrança motivava a constante nomeação e destituição dos líderes locais em curto espaço de tempo, como forma de manter a arrecadação em alta; também a venda de cargos eclesiásticos, conhecida como simonia, era largamente praticada dentro da Igreja(6).

Já no século XVI, o destaque deve ser dado à venda de indulgências, um documento vendido pela Igreja que absolvia o pecador dos castigos temporais relativos aos seus pecados, após a confissão; o povo era estimulado a crer que a compra de indulgências, que alimentava os cofres da Igreja administrados pelo papa, lhe garantia o perdão dos pecados, podendo servir também de benefício para as almas no purgatório. Martinho Lutero (1.483 - 1.546), monge agostiniano, questionou este procedimento, dando início à Reforma Luterana em 1.517(7).

DÍZIMOS E OFERTAS, HOJE

Ao analisarmos os textos bíblicos apresentados neste artigo, parece ficar claro que:

a) o dízimo não era subtraído da família do ofertante, sendo usado também para consumo da própria família

b) a parte do dízimo que não era consumida pela família, não era destinada exclusivamente aos sacerdotes e levitas, mas também provia o sustento dos que eram desprovidos: estrangeiros, órfãos e viúvas

c) a Igreja Primitiva usava os recursos do dízimo e ofertas com o fim de socorrer os necessitados entre eles, promovendo a igualdade entre os irmãos; quando não era este o caso, servia para o sustento de líderes como o apóstolo Paulo; no entanto, mesmo ele não vivia sempre exclusivamente do dízimo (Atos 18:1 - 3; 20:33 - 35; I Tessalonicenses 2:9, 10; II Tessalonicenses 3:6 - 12)

Nestes quase 2.000 anos de fé cristã, muita coisa mudou nas diversas comunidades locais de fé, às quais convencionamos chamar de Igrejas; de um inexpressivo grupo de perseguidos, as diversas organizações eclesiásticas se institucionalizaram, exercendo, em muitas regiões do Globo, seu direito ao livre exercício de religiosidade e vivência da fé; a pergunta é: onde o dízimo encaixa-se neste contexto?

A institucionalização da comunidade da fé, em suas diversas expressões organizacionais, não sai de graça; manter a organização chamada Igreja tem seu custo, maior ou menor, dependendo da estrutura organizacional, da qualidade do espaço físico, dos objetivos e atividades, etc.; objetivando manter a independência da Igreja em relação a forças externas a ela, (p. ex., o Estado), seu sustento passa a depender de uma única fonte: os dízimos e ofertas doados pelos membros da comunidade eclesiástica.

No entanto, é lamentável percebermos que, mesmo sendo independente do Estado (na grande maioria dos casos), em diversos casos as Igrejas se tornam dependentes do humor de seus membros, e o que é pregado depende do gosto dos ouvintes, especialmente dos mais antigos e dos mais ricos; se aquilo que o pastor prega está de acordo com os interesses destes grupos (que nem sempre estão de acordo com a Palavra de Deus), então seu dízimo está garantido; se não, o dízimo é sonegado, até que, ou o pastor se enquadra, ou ele sai, e começa todo um processo político para que haja um novo pastor, atendendo este ou aquele grupo de interesse; este processo pode parecer escandaloso, mas é mais comum do que se imagina.

Também é comum vermos que determinadas organizações religiosas, visando aumentar sua arrecadação, buscam outros meios para isso, além da doação voluntária dos seus membros; estimula-se a aquisição de elementos simbólicos e/ou ritualísticos, supostamente dotados de poderes espirituais para abençoar seu possuidor; outro expediente é a comercialização de produtos como livros, cd's ou dvd's, cujo conteúdo seriam mensagens relativas ao Evangelho de Cristo (o que nem sempre se verifica na prática); adesivos, camisetas, marcadores de livros, ímãs de geladeira, bonés, caixinhas de promessas, canetas, cadernos, pastas, quadros, vasos, chaveiros (ufa!) engrossam a lista dos "produtos gospel".

A ênfase na arrecadação de dízimos e ofertas dos membros e/ou frequentadores das Igrejas cresce na medida em que cresce a complexidade das organizações eclesiásticas, e é comum vermos os líderes destas Igrejas lançarem mão de todos os meios para convencer seus ouvintes a trazerem seus dízimos e ofertas; até mesmo a ameaça com o castigo divino sobre aqueles que não entregam seu dízimo é usada, amedrontando os ouvintes com a perda da salvação; é difícil não compararmos o procedimento destes líderes com a prática católica medieval da venda de indulgências para o perdão dos pecados; grande parte da assim chamada igreja evangélica deu um enorme passo atrás em termos da Reforma do século XVI, para não dizermos em relação ao Evangelho de Cristo. É possivel imaginarmos, com certo grau de segurança, que entre as classes mais desprovidas economicamente, muitos dos que são dizimistas em suas Igrejas sustentam uma estrutura organizacional cara, e que dificilmente lhes dá algum retorno em provisão das reais necessidades suas e de suas famílias, quando, segundo o que vimos nos textos de Deuteronômio, o dízimo poderia ser gasto no sustento da própria família do dizimista.

Fora o sustento destas instituições tão onerosas, não é incomum observarmos que os líderes de muitas destas Igrejas vivem um padrão de vida além do que seria chamado de confortável, recebendo das Igrejas que dirigem o sustento pago pelos membros, que seguramente, não ganham o mesmo tanto em seu labor diário, e que mesmo com tais restrições orçamentárias, sustentam como podem suas famílias; tais líderes são semelhantes aos falsos profetas, enganadores de Israel, que foram repreendidos pelo Senhor através do profeta Miqueias (Miqueias 3:5).

Por fim, podemos imaginar que, ao menos parte destas Igrejas, tenham programas de socorro aos necessitados, ou investem no campo missionário e no ensino bíblico; mas a estrutura organizacional torna-se tão onerosa, que muitos dos recursos angariados entre os membros da Igreja que poderiam ser usados para estas nobres finalidades, são gastos com burocracia excessiva.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, quero defender os seguintes pontos:

a) o dízimo é muito importante para a Igreja e as igrejas, visando a provisão independente dos meios para cumprir os objetivos dados por Deus aos seus filhos: promover o testemunho do Evangelho de Cristo e encaminhar as pessoas no caminho da salvação; por isto mesmo, erram aqueles que buscam manipular o que é pregado através da Igreja, sonegando seus dízimos e causando instabilidade no ministério pastoral; os cristãos que agem assim são tão bons quanto os escribas e fariseus no tempo de Jesus

b) é tempo das Igrejas ditas evangélicas, seja qual for sua organização/denominação, reverem suas estruturas organizacionais com olhar crítico, de forma a verificar se os objetivos de Deus para Sua Igreja estão sendo cumpridos - anúncio do Evangelho de Cristo (Mateus 28:18 - 20; Atos 1:8; Romanos 1:15, 16; II Timóteo 4:2), promoção da edificação espiritual da vida dos fiéis através da comunhão interpessoal e do ensino da Palavra de Deus (Efésios 4:11 - 16; I Tessalonicenses 5:14; Hebreus 10:23 - 25; II Pedro 1-5 - 9), e socorro aos necessitados, dentro e fora da Igreja (Romanos 15:26; Gálatas 6:9, 10; Hebreus 13:16; Tiago 1:27) - para que não haja desperdício dos recursos doados pelos fiéis

c) é tempo de se abrir os olhos às pessoas, para que deixem de ser enganadas pelos supostos líderes espirituais, que constroem verdadeiros impérios religiosos em honra à sua própria vaidade e ambição, arrancando "a pele, a carne e os ossos de suas ovelhas"(8) 

d) é tempo de os membros das Igrejas encontrarem nelas estruturas organizacionais sadias, que cumpram os objetivos estabelecidos por Deus para Sua Igreja

e) é tempo de, iluminados pela Palavra de Deus, os membros das Igrejas usarem a liberdade  de exercitar a prática do dízimo  e de ofertas de maneira bíblica, digna, livre de pressões e com genuína alegria espiritual


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REFERÊNCIAS
(1) - ELWELL, Walter A. “Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã” – Tradução de Gordon Chown - Ed. Vida Nova – 1ª edição, reimpressão em 1 volume, 2009 – volume 1, pg. 487

(2) - ELWELL, Walter A. “Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã” – Tradução de Gordon Chown - Ed. Vida Nova – 1ª edição, reimpressão em 1 volume, 2009 – volume 3, pg. 48

(3) - FRANGIOTTI, Roque “Padres Apostólicos” – Tradução de Ivo Storniolo e Euclides M. Balancin – Ed. Paulus – 4ª edição, 2008 – pg. 357

(4) - ELWELL, Walter A. “Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã” – Tradução de Gordon Chown - Ed. Vida Nova – 1ª edição, reimpressão em 1 volume, 2009 – volume 1, pg. 488

(5) - ELWELL, Walter A. “Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã” – Tradução de Gordon Chown - Ed. Vida Nova – 1ª edição, reimpressão em 1 volume, 2009 – volume 3, pg. 62

(6) - CAIRNS, Earle E. “O cristianismo através dos séculos” – Ed. Vida Nova – tradução de Israel Belo de Azevedo – 3ª edição, 2008 – pg. 221, 225

(7) - CAIRNS, Earle E. “O cristianismo através dos séculos” – Ed. Vida Nova – tradução de Israel Belo de Azevedo – 3ª edição, 2008 – pg. 259, 260

(8) - LUTERO, Martinho “Do Cativeiro Babilônico da Igreja” – Ed. Martin Claret, 2006 – pg. 127

    

quarta-feira, 10 de abril de 2013

A Reforma Católica do século XVI e o papa Francisco



por: José Augusto de Oliveira Maia
20/03/2013



Um dos grandes prazeres em escrever sobre assuntos ligados à História consiste justamente na possibilidade de, ao refletirmos sobre assuntos do passado, aplicarmos ao menos parte de nossas conclusões ao presente, e quem sabe, apontarmos caminhos possíveis para o futuro.

Na História do cristianismo, o século XVI ficou marcado pelo conjunto de movimentos reformadores - luterano, calvinista, anglicano, anabatista, etc. - que buscavam uma outra face para a Igreja Católica; o objetivo dos reformadores não era dividir a Igreja, mas resgatar a fé original dos primeiros discípulos do Senhor, livrando o cristianismo ocidental da corrupção dos prelados romanos, e trazendo a mensagem da Igreja de volta à centralidade doutrinária da Bíblia.

Infelizmente, a almejada reforma não foi possível, dada a resistência de um clero apegado aos privilégios construídos ao longo de séculos, que utilizavam inclusive os dogmas católicos como fonte de lucro, ao mesmo tempo em que mantinham o povo na ignorância a respeito do conteúdo da Bíblia; aonde a Bíblia chegava na linguagem do homem comum, e não no latim dos bispos, era impossível resistir aos impulsos reformadores; porém, ao perceber que suas propostas de reforma não eram aceitas por Roma, os reformadores não tiveram opção a não ser organizar novos modelos de Igreja.

Inevitavelmente, porém, os desafios impostos pela Reforma a Roma não poderiam ficar sem uma resposta; ao contrário das outras vezes, quando a Inquisição conseguira eliminar ou minimizar os efeitos dos movimentos contestatórios (por exemplo, João Huss na Bohemia, que foi condenado pelo Concílio de Constança em 1.415, e executado na fogueira), desta vez as forças da Igreja Católica não puderam abafar um clamor que se alastrava por toda a Europa, e que já se ouvia desde os tempos do Conciliarismo no século XIV.

E assim, um outro movimento de reforma teve lugar no mesmo período, ao qual costumeiramente damos pouca atenção; mas o que o torna mais importante nos dias de hoje, é o fato de que alguns detalhes deste movimento estão novamente presentes entre nós: refiro-me à Reforma interna da Igreja Católica, no mesmo século XVI.

Enquanto a chamada Contra-Reforma foi um movimento católico de reação à Reforma Protestante, a Reforma Católica significou o reconhecimento pela própria Igreja de Roma que, tal como corriam as coisas em seu interior, seu futuro como instituição estava seriamente ameaçado, ainda mais diante de uma Europa dividida entre o rebanho católico e os apriscos protestantes.

O pontapé inicial foi dado pelo papa Paulo III (Alessandro Farnese, 1.534 - 1.549), instituindo uma comissão de cardeais encarregada de planejar uma reforma para a Igreja; o relatório apresentado pelos cardeais Gian Pietro Caraffa, Gaspar Contarini e Reginaldo Pólo concluiu pelo reconhecimento da existência de diversos abusos praticados pelo alto clero no seio da Igreja, cujos prelados enriqueciam através do uso corrupto de seus cargos, ao mesmo tempo em que negligenciavam suas obrigações pastorais.

Dadas as conclusões da comissão, medidas reformadoras foram tomadas pelos papas, a partir do próprio Paulo III, com a convocação do Concílio de Trento (1.545 - 1.563); já na sua abertura, no decreto sobre regras de vida a serem observadas, exorta-se aos presentes que "procurem emendar-se dos seus erros e pecados cometidos até o presente, e procedam daqui para a frente com temor a Deus sem condescender aos desejos da carne".

Devido à sua longa duração -  interrompido duas vezes, entre 1.547 - 1.551, e entre 1.552 - 1.562 -, o Concílio desenvolveu-se sob o pontificado de cinco papas diferentes, uns mais, outros menos inclinados à proceder às reformas necessárias; Júlio III (Giovanni Maria del Monte, 1.550 - 1.555) e Paulo IV (Gian Pietro Caraffa, 1.555 - 1.559), por exemplo, foram papas cujo pontificado foi marcado pelo nepotismo, a indicação de parentes para cargos importantes na Cúria. Vê-se claramente pelas datas que, durante estes dois pontificados, ocorreu a segunda e maior interrupção do Concílio que pretendia reformar a Igreja.

Mas além, é claro, da reafirmação dos dogmas católicos, medidas de correção de abusos foram efetivamente implantadas a partir do papa Pio IV (Giovanni Angelo de Médici, 1.559 - 1.565) e os que o seguiram: Pio V (Antonio Chislieri, 1.565 - 1.572), Gregório XIII (Ugo Boncompagni, 1.572 - 1.585) e Sixto V (Felipe Peretti, 1.585 - 1.590); os efeitos destas medidas, aos poucos, foram se manifestando na vida da Igreja; e é neste ponto, creio, que podemos chegar à aplicação da História aos nossos dias.

O assim chamado escândalo do Vatileaks, detonado em 2.012 a partir do vazamento de diversos documentos secretos do papa Bento XVI, que revelaram uma Igreja permeada de disputas internas por poder entre cardeais e outras autoridades da Igreja, além de mal explicadas questões financeiras, ensejou a nomeação pelo agora papa emérito de uma comissão cardinalícia - cardeais Julian Herranz, Josef Tomko e Salvatore de Giorgi - para avaliar a situação criada para a Igreja; tal nomeação veio em boa hora, visto que Roma está sendo bombardeada de todos os lados por escândalos de pedofilia envolvendo sacerdotes, e de corrupção financeira no Instituto de Obras Religiosas (IOR), mais conhecido como Banco do Vaticano; apesar da pressão por uma parte dos cardeais reunidos no último conclave para terem acesso ao relatório final da comissão, Bento XVI reservou o conteúdo deste relatório apenas ao seu sucessor, o recém eleito papa Francisco.

Surgem então as perguntas naturais desta situação: o que o novo papa encontrará neste relatório? Quais as medidas que deverão ser tomadas diante da situação encontrada? O papa Francisco terá forças para iniciar o processo de mudanças? Quais os caminhos que a Igreja seguirá daqui em diante?

Como vimos no século XVI, as reformas apontadas no Concílio de Trento, ainda que muito lentamente, foram implantadas não apenas por um, mas por uma sequência de pontífices, ao longo de três décadas; agora, no século XXI, uma nova onda de reformas se faz urgente...o pontificado de Francisco está apenas começando...mas haverá tempo hábil para que a nova Reforma seja produzida, e que seus efeitos se façam sentir? O futuro, caro leitor, é apenas uma questão de tempo... 

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terça-feira, 9 de abril de 2013

Por uma nova organização eclesiástica



por: José Augusto de Oliveira Maia
11.03.2013



Introdução

O motivo de dedicar-me a produzir este trabalho é a percepção, possivelmente bastante realista, de que o modelo organizacional das Igrejas em geral (aqui me refiro mais especificamente à Igreja local, mas esta percepção também pode ser aplicada à estrutura denominacional), tornou-se hoje algo tão complexo, que fica difícil vê-lo alcançando os objetivos de Deus para a presença física do Corpo de Cristo na Terra.

Portanto, pretendo aqui dar uma modesta contribuição para o que possa ser um processo de repensarmos e reorganizarmos nossas estruturas eclesiásticas, buscando tornar o ambiente das Igrejas locais e seus processos internos menos tensos, e quem sabe assim, trazer mais e melhores resultados para sua atuação.

Minha experiência na Igreja local

Nasci em um lar católico em 1.969, e a partir dos 10 anos, comecei a frequentar uma igreja evangélica pentecostal independente, do que se convencionou chamar de pentecostalismo de segunda onda; costumo situar a minha conversão ao Evangelho em algum momento do ano de 1.980.

Em cerca de 33 anos de conversão, pude verificar pelo menos 4 modelos diferentes de organização eclesiástica nas Igrejas pelas quais passei (apresentados aqui de maneira objetiva):

a.) A Igreja local grande, com o número de membros girando em torno de 1.000 pessoas, e com o comando da Igreja centralizado na figura do pastor principal, que diz o quê, quando e como algo será feito, e quem o fará; ao mesmo tempo, a mesma figura pastoral diz o quê, quando e como algo não será feito; é muito difícil vermos neste modelo alguém questionar alguma coisa sem ser acusado de se levantar contra o “ungido do Senhor”; com o tempo, a vulnerabilidade deste sistema torna-se evidente, e se não for corrigido a tempo, as consequências ruins surgirão inevitavelmente.

b.) A Igreja local pequena, com o número de membros de até 200 pessoas e uma estrutura organizacional simples, cujas decisões são tomadas por uma assembléia composta de todos os membros, e convocada regularmente; este modelo tende a dar certo, desde que todos os membros tenham clareza sobre os objetivos que se deseja alcançar.

c.) A Igreja local média, acima dos 200 membros, com uma estrutura organizacional complexa, e dirigida por um conselho eleito pela assembleia dos membros da Igreja; dependendo do grau de complexidade da organização, podem ocorrer choques entre as organizações internas, falhas de comunicação, conflitos (e por conflitos refiro-me a brigas entre as pessoas na direção da Igreja), e o sucesso apenas parcial ou mesmo o fracasso no alcance de seus objetivos.

d.) A Igreja local pequena, limitada a 200 membros, uma estrutura organizacional mediana, e cujas decisões são tomadas, se não diretamente pelo pastor, sob sua forte influência; é um modelo que pode até funcionar bem, mas sua dependência da pessoa do pastor inibe o desenvolvimento de uma liderança amadurecida, capaz, e que faça a diferença.

Nas Igrejas que adotaram os modelos acima, tive a oportunidade de ver um pouco de tudo: membros que deixam a Igreja por discordarem da liderança do pastor; pastores que dizem quem pode o quê, de acordo com seus próprios critérios e interesses; membros que se articulam politicamente para depor o pastor do qual não gostam; pastores que articulam a exclusão de membros que não o agradam; membros que deixam a Igreja por rivalidade com outros membros; e assim segue a lista. Mais do que nunca, estas situações têm causado nos membros das Igrejas muitas frustrações, escândalos, enfraquecimento na fé, e o que poderíamos chamar aqui de stress pós-traumático, muitas vezes ocasionado por um excesso de ativismo religioso que promove mais desagregação do que testemunho do Evangelho e edificação espiritual.

Muito embora o objetivo aqui declarado seja contribuir para a construção de um novo modelo eclesiástico, não posso deixar de observar que, nos casos acima, o que falta muitas e muitas vezes é transformação de vida, humildade, e para ilustrar melhor, a real presença do fruto do Espírito na vida das pessoas, quer sejam os membros, sua liderança, ou mesmo o pastor; neste caso, tenho plena consciência, pela Palavra de Deus, a Bíblia, que só um processo de conversão genuína, ou arrependimento profundo e radical, podem resolver ou prevenir estas ocorrências; do contrário, qualquer movimentação será “como o metal que soa, ou como o sino que tine” (I Coríntios 13:1): acabando a vibração, acaba o efeito.

Propósitos de Deus para Sua Igreja que encontro na Bíblia

Embora o termo “Igreja” na Bíblia refira-se muitas vezes à Noiva de Cristo, ou ao Corpo de Cristo, o conjunto de pessoas que tiveram seus pecados lavados através da fé no sangue de Cristo (Efésios 1:20 – 23; Apocalipse 7:9 – 14; 19:7, 8), penso poder afirmar que, necessariamente, esta Igreja organiza-se em grupos, em sua maioria institucionais, e que estes grupos pretendem ser a expressão humana da Igreja de Cristo neste mundo. Sendo assim, parto do princípio de que os propósitos de Deus para Sua Igreja são os mesmos que devem ser observados pelas Igrejas locais.

Apresento aqui então três propósitos de Deus como podemos encontrar na Bíblia:

a.) A missão de levar o Evangelho, a mensagem de perdão dos pecados através da fé no sacrifício de Cristo, para todas as pessoas (Mateus 28:18 – 20; Lucas 24:46 – 48; Atos 1:8; Romanos 1:15, 16; II Timóteo 4:2).

b.) Socorro aos necessitados, dentro e fora da Igreja (Romanos 15:26; Gálatas 6:9, 10; Hebreus 13:16; Tiago 1:27).

c.) Edificação espiritual, através do ensino da Palavra de Deus e da comunhão mútua (Efésios 4:11 – 16; I Tessalonicenses 5:14; Hebreus 10:23 – 25; II Pedro 1:5 – 9).

Acredito sinceramente que se nossas Igrejas concentrarem-se nestes objetivos, estaremos seguindo com segurança aquilo que Deus deseja para Sua Igreja.

A pergunta é:

“E como exatamente devemos proceder para executarmos na prática estas ações, realizando estes propósitos de Deus?” Tenho certeza que cada Igreja local encontrará a forma específica de realizar estas coisas, de acordo com a realidade de cada uma.

Em termos de evangelização, a Igreja local pode optar pela região ao seu redor; pode (e deve!) estimular seus membros ao testemunho pessoal, apoiando-os, por exemplo, com material evangelístico; enviar e/ou apoiar missionários em campos mais distantes; as ideias seguem.

No tocante ao socorro aos necessitados, podemos observar internamente os membros, ou famílias que tenham necessidades materiais, e procurar supri-las através da própria comunidade; cestas básicas, roupas, remédios (com os devidos cuidados), uma carona para o idoso ao hospital para tratamento... enfim, exemplos não faltam; e externamente, campanhas do agasalho, distribuição de alimentos em favelas, campanhas de doações para asilos e orfanatos...

E sobre a edificação espiritual, nada como o cuidado na ministração sadia de estudos bíblicos (nos lares, na própria Igreja, sobre assuntos específicos e atuais), e a exortação ao apoio mútuo e fraterno entre os irmãos.

Como disse de início, cada Igreja poderá encontrar seus próprios caminhos para esta jornada; o importante é trabalhar de forma amorosa e contínua, com organização simples e eficaz, tendo por objetivo o Reino de Deus e as almas a serem ganhas para Cristo.

E quanto à hierarquia...

Lógico, nada se faz sem uma direção reconhecida e aceita por todos; mas uma das ideias que quero defender aqui é que, quanto mais simplicidade imprimirmos às nossas ações, e mais objetividade aos nossos procedimentos, mais consistentemente poderemos avançar.

Portanto, gostaria de sugerir aqui as duas esferas de hierarquia que devem funcionar na Igreja: a administrativa e a eclesiástica.

Quando me refiro à hierarquia administrativa, quero dizer o conjunto de pessoas que realizarão tarefas quanto à representação da Igreja (presidência), à administração de seus recursos financeiros (tesouraria e conselho fiscal: controlar, pagar, receber, investir, conferir, etc.) e ao registro do histórico da Igreja e do controle das informações sobre sua membresia (secretaria: atas de reunião e de assembleias, controle de documentações, cadastro de membros).

Assim, proponho uma estrutura bem simples no organograma a seguir:






No tocante à hierarquia eclesiástica, como minha convivência maior é no meio batista, apresento aqui uma estrutura baseada nas figuras do pastor e do diácono; sei que outras Igrejas adotam outros cargos eclesiásticos, e tenho certeza que as devidas adaptações poderão ser feitas.

No modelo que proponho aqui, a questão dos propósitos de Deus para a Igreja local é fundamental, pois o trabalho dos diáconos girará em torno destes propósitos; dentro de cada um destes propósitos, sugiro o número de três diáconos; e por quê especificamente três? Porque isto pode evitar a excessiva dependência de uma única pessoa, a sobrecarga de trabalho, o risco de uma vacância inesperada e paralisação do trabalho; e não é um número par (dois, por exemplo), para reduzir o risco de um empate na tomada de decisões internas.

Assim, a Igreja terá um pastor auxiliado por nove diáconos, conforme o esquema abaixo:















Dentro de cada propósito destes, os diáconos deverão articular junto com o pastor a forma de trabalhar; mas como já dito anteriormente, sempre tendo em vista a simplicidade e a objetividade.

É claro que enxergo para o diaconato da igreja outras atividades além destas, conforme apresento abaixo:

a.) Os diáconos deverão participar ativamente na direção dos cultos, deixando para o pastor a responsabilidade da pregação; é interessante que os diáconos sejam estimulados a pregar nos cultos também, e dar a eles o devido apoio, através de cursos de exegese, e até quem sabe, de homilética.

b.) O serviço de abertura e fechamento da Igreja, bem como a recepção durante os cultos na porta da Igreja, também deverá ser reservado aos diáconos; o atendimento aos membros da Igreja e visitantes, no tocante à circulação e uso das dependências (banheiro, cantina, berçário, estacionamento, etc), também fica a cargo do diaconato.

c.) Durante a celebração da ceia, os diáconos auxiliarão o pastor, servindo à Igreja.

d.) O pastoreio da Igreja, embora seja atribuição pastoral, deve ser dividido com os diáconos; sugiro que se faça um mapeamento geográfico da membresia da Igreja, deixando para cada diácono uma certa quantidade de núcleos familiares (defino isto como conjunto de pessoas que moram no mesmo endereço), que morem próximo deste mesmo diácono, facilitando o atendimento; logicamente, os casos mais complexos deverão ser encaminhados ao pastor.

e.) A realização de batismos pelo pastor também deverá ser auxiliada pelos diáconos.

Em ocasiões de cultos com um procedimento litúrgico mais complexo (ex.: dia de celebração da ceia, batismo), é bem-vinda a elaboração de uma escala de trabalho; para isso, é interessante que os diáconos elejam entre si um coordenador, que além de administrar o serviço diaconal no espaço e horário dos cultos, poderá ocasionalmente representar o corpo diaconal perante a Igreja e o pastor.

Tratando ainda de ambas as hierarquias, entendo ser recomendável que nenhum dos cargos da hierarquia administrativa da Igreja seja exercido pelo pastor ou pelos diáconos, para evitar o acúmulo de funções; mas que a Igreja tenha oportunidade de escolher entre seus membros pessoas para exercer separadamente as funções administrativas e eclesiásticas, com a possível exceção do pastor, que deverá ser escolhido de acordo com as diretrizes da denominação de cada Igreja.

Para o caso dos cargos a serem preenchidos, entendo que nenhum trabalho pode ser realizado de forma consistente num período relativamente curto, de um ano; acho interessante que as pessoas que componham a hierarquia administrativa sejam eleitas para períodos de dois anos, sendo reeleitas, quando for o caso.

Para a hierarquia eclesiástica, é claro que normalmente o pastor seja escolhido para exercer seu pastorado por tempo indeterminado; no caso dos diáconos, entendo que o ideal seja um cargo vitalício, sujeito aos casos de disciplina e perda do cargo, se for necessário; mas seria interessante que o coordenador dos diáconos também tivesse um mandado de dois anos, e que a cada dois anos, se fizesse o rodízio dos diáconos entre as três áreas de atuação, para que todos eles pudessem ser exercitados em todo o trabalho da Igreja; e nos casos de saída de algum dos diáconos, que a Igreja possa escolher outro para preencher sua vaga.

Considerações finais

Bem, como disse a princípio, este texto tem a intenção de ser apenas uma contribuição; não escrevi aqui uma receita de bolo, nem algo como “três passos fáceis para o sucesso da Igreja”; mas creio que dois pontos fundamentais devem ser ressaltados:

* Concentração nos objetivos bíblicos: evangelismo, socorro aos necessitados e edificação espiritual.

* Ter os objetivos bem claros, para que ao montarmos nossas ações, não percamos a objetividade; e criar estruturas simples, para que amanhã os meios não se tornem maiores do que os objetivos, e não venham a tornar-se um fim em si mesmos.

Desejo, de coração, que todos os que lerem este texto possam ser inspirados a refletir como tem sido nossa vida como Igreja, e quem sabe, possamos encontrar formas de aperfeiçoar nossos caminhos.

Clique no link abaixo, e veja o livro "POR UMA NOVA ORGANIZAÇÃO ECLESIÁSTICA", com este artigo e outros materiais.

https://www.clubedeautores.com.br/book/175801--Por_uma_nova_organizacao#.W1NNltVKjIU


Acesse o link e assista ao vídeo "O pecado te ameaça à porta 2".

https://www.youtube.com/watch?v=9UTr0MVZbpQ