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domingo, 17 de abril de 2022

UM RELACIONAMENTO BASEADO EM ARREPENDIMENTO E FÉ

 


por: José Augusto de Oliveira Maia

17.04.2022


“Sua intenção era chamar os pecadores, não os justos, para ter um relacionamento com Ele.”

A frase acima, embora pareça muito inspiradora, fica muito aquém da mensagem do Evangelho; sua construção é feita a partir de uma passagem bíblica situada em Mateus 9:9 – 13; Marcos 2:13 – 17; e Lucas 5:27 – 32; estas passagens finalizam com uma famosa frase de Jesus: “Eu não vim chamar justos, mas pecadores.”; Lucas, porém, complementa a fala de Jesus presente em Mateus e Marcos, escrevendo assim: “Eu não vim chamar justos, mas pecadores ao arrependimento.”

As circunstâncias dessa frase de Jesus são exatamente as mesmas nos três evangelhos sinópticos: Jesus está em seus primeiros tempos de ministério terreno, na região da Galileia, ao norte da Palestina, próximo ao mar da Galileia, realizando milagres, expulsando demônios e chamando os primeiros discípulos; seus ensinamentos já começam a incomodar os líderes religiosos entre os judeus, fariseus e mestres da Lei, que o acompanhavam de perto.

Antes de curar o paralítico em Cafarnaum trazido por seus quatro amigos (Marcos 2:1 – 12), “Jesus, vendo a fé deles, disse-lhes: ‘Homem, os seus pecados estão perdoados.’”; tal afirmação de Jesus foi tachada pelos fariseus e mestres da Lei como blasfêmia, ao afirmarem que apenas Deus tinha poder de perdoar pecados, questionando a autoridade de Jesus; no entanto, para demonstrar sua autoridade, Jesus lhes respondeu: “Por que vocês estão pensando assim? Que é mais fácil dizer: ‘Os seus pecados estão perdoados’, ou ‘Levante-se e ande’? Mas, para que vocês saibam que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados” (virou-se para o paralítico e disse): “Eu lhe digo: levante-se, pegue sua cama, e vá para casa.”; diante da cura miraculosa do paralítico conforme as palavras de Jesus, sua autoridade para perdoar pecados ficou manifesta.

É nesse contexto que Jesus chama Mateus (ou na versão hebraica, Levi), um judeu, coletor de impostos para o Império Romano, considerado um traidor e um corrupto pelos seus patrícios, para segui-Lo; diante do convite de Mateus para um banquete em sua casa, Jesus reúne-se naquela refeição com outros publicanos, e os fariseus seguem questionando seus discípulos; como um homem que reivindica para si a autoridade para perdoar pecados, reúne-se para uma refeição com pecadores como aqueles? Como um mestre pode ser seguido e reverenciado tornando-se cerimonialmente impuro ao comer com pecadores?

A resposta de Jesus é fulminante: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Eu não vim chamar justos, mas pecadores ao arrependimento.”

Notem que a postura dos fariseus e mestres da Lei era de condenação contra os publicanos e demais pecadores, julgando-se a sim mesmos isentos de pecado; essa postura foi sintetizada por Jesus na parábola do fariseu e do publicano (Lucas 18:9 – 14), na qual aqueles que confiavam em sua própria justiça terminavam condenados por Deus, ao passo que aqueles que se refugiavam na misericórdia de Deus encontravam Seu perdão.

Os fariseus e mestres da Lei tinham razão quando afirmavam que só Deus podia perdoar pecados; Jesus tinha e tem autoridade para perdoar pecados, pois ele é Deus; ele é o Salvador dado por Deus à Humanidade, cujo sacrifício pagou o preço exigido pela justiça divina para o perdão dos nossos pecados (Colossenses 1:13, 14; I Pedro 1:18 – 21), mediante a fé em Jesus.

No entanto, o chamado de Jesus aos que querem segui-lo começa com um chamado ao arrependimento; tanto fariseus quanto mestres da Lei julgavam-se justos, que não necessitavam de arrependimento, nem de um salvador, pois aos seus olhos sua justiça própria bastava para se apresentarem diante de Deus; o chamado de Jesus não era para estes, mas para aqueles que se reconheciam como pecadores e sabiam claramente de sua necessidade de um salvador; a estes Jesus estendia a graça do perdão, porém dizendo logo de início: “Arrependam-se!”.

O relacionamento para o qual Jesus chama os pecadores começa em dois pontos: arrependimento dos pecados e fé em um Salvador, Jesus Cristo; sem isto, não há um relacionamento, mas um engano permanente para aqueles que, não reconhecendo sua condição de pecadores, pretendem apresentar a Deus os trapos imundos de sua própria justiça, colocam-se longe da misericórdia divina e condenam-se à eternidade no inferno. Jesus não é apenas mais um bom mestre a quem você pode simplesmente escolher ou não seguir; ou ele é o seu Salvador, ou não será nada.

domingo, 29 de agosto de 2021

Série de estudos na 2ª Epístola do Apóstolo Pedro - 5ª e última parte

 por: José Augusto de Oliveira Maia

29/08/2021


Esta série de estudos foi ministrada pelo autor deste artigo na Igreja Batista de Pinheiros, na classe de discipulado chamada Classe Beta, para novos convertidos, entre o final de 2020 e o início de 2021.

A VIDA DA IGREJA NA EXPECTATIVA DO JUÍZO FINAL

Na quarta parte de nosso estudo, vimos em II Pedro 3:1 - 10 que o apóstolo apelava novamente à memória dos discípulos, e alertava contra aqueles que negavam o ensino sobre a segunda vinda de Cristo; ele responde a este falso ensino usando o exemplo do Dilúvio, mostrando que a estabilidade de então não assegurava a inexistência do juízo, assim como Jesus também alertou neste sentido com o exemplo de Sodoma e Gomorra; por outro lado, a aparente demora é um indicativo da misericórdia e paciência de Deus, almejando a salvação das almas, e a promessa da segunda vinda de Cristo permanece, pois Deus não mente.

Assim, Pedro conclui sua carta, diante da expectativa do Juízo Final (II Pedro 3:11 - 13), voltando ao ponto inicial, quanto trata do nosso crescimento espiritual (II Pedro 1:5 - 8), sempre sobre o alicerce da fé recebida com a proclamação do Evangelho (II Pedro 1:1); ele insiste que a fé verdadeira no Evangelho de Cristo impede que vivamos uma vida cristã prática inoperante e improdutiva, e assim nosso viver deve ser santo e piedoso, oposto ao viver dissoluto dos que seguem os conceitos do mundo e/ou as heresias ensinadas pelos falsos mestres; com base nessa fé e na promessa de Deus, um dia viveremos em um novo céu e em uma nova terra, onde as virtudes espirituais serão a regra, e não a exceção, para a glória de Deus (Isaías 66:22)!

Pedro segue nos exortando (II Pedro 3:14 - 16) quanto ao zelo pela nossa vida espiritual, e reforça que o tempo de espera reflete a paciência de Deus em prol da salvação daqueles que ainda não se arrependeram (II Pedro 3:8, 9); ele ressalta que seu ensino a este respeito é o mesmo de Paulo, e ao reafirmar a condenação daqueles que distorcem tanto as cartas do apóstolo quanto as "demais Escrituras", Pedro põe em pé de igualdade a autoridade de ambos os textos divinamente inspirados, condenando os falsos mestres e seus discípulos.

Concluindo (II Pedro 3:17, 18), uma vez que temos todo este conhecimento, devemos nos empenhar para não sermos enganados pelos ensinos de falsos mestres (II Pedro 2:18; Tiago 1:21), mas crescermos na graça e no conhecimento de Cristo; não devemos ter esperança em nosso próprio esforço e disciplina para amadurecermos na fé e termos uma vida aprovada por Deus; nossa fé tem que estar única e exclusivamente na pessoa e na obra de Jesus Cristo realizada na cruz por nós, e nossa esperança de redenção deve permanecer firmada somente n'Ele.  

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Nossas orações e a vontade divina

 

por:

José Augusto de Oliveira Maia

28/04/2021


Fui surpreendido outro dia com uma frase, intitulada de "Oração poderosa", através da qual a pessoa pedia uma graça a Deus, concluindo com a afirmação: "O milagre acontecerá em 4 dias."

Confesso minha tristeza ao ver pessoas, inclusive no meio evangélico, apegando-se a este tipo de prática, na qual vejo dois graves perigos para quem a adota:

a) atribuir o poder que pertence a Deus (Salmo 62:11) a uma oração padrão

b) querer estabelecer um prazo dentro do qual necessariamente Deus efetuará o milagre desejado

Imagino que você possa me perguntar: "Mas Tiago não afirma que a oração do justo é poderosa em seus efeitos?" (Tiago 5:16); sim, com certeza; mas quero recordar a você o exemplo que Tiago deu para ilustrar esta afirmação.

Na sequência, ele cita o profeta Elias e a ocasião em que Deus enviou uma seca sobre Israel por causa dos pecados do rei Acabe (I Reis 17:1 e seg.); no caso concreto, não foi pela mera iniciativa do profeta que veio a seca sobre o país, mas como castigo enviado por Deus contra a rebelião do rei e do povo, como o Senhor já havia prometido a Israel desde os tempos de Moisés (Deuteronômio 28:15 - 68); e somente quando o Senhor pronunciou Sua palavra, choveu novamente (I Reis 18:1); não era a palavra ou a oração do profeta que determinava a ação de Deus, mas ele servia apenas como anunciador da vontade divina; Deus é o controlador de tudo o que existe, e não é subordinado à palavra de qualquer homem ou mulher.

Além disso, cumpre observarmos que o mesmo Deus que anunciou a seca através do profeta, também usou o mesmo profeta para milagrosamente prover sustento para a viúva e cura para seu filho (I Reis 17:7 - 24), e para desafiar 850 pagãos idólatras, 450 profetas de Baal e 400 profetas de Asera, com fogo do céu no monte Carmelo (I Reis 18:16 - 40); veja que era um exemplo de homem de Deus com o qual, duvido, qualquer um de nós queira comparar-se nos dias de hoje.

E quero que você recorde que o mesmo Tiago, comparando-nos com uma neblina passageira, exortou-nos a dizer: "Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo." (Tiago 4:13 - 16); ou seja, nossos planos, projetos e desejos devem ser submetidos à vontade de Deus, o qual nos atenderá apenas em conformidade com Sua vontade (I João 5:14).

Assim, Deus nos faz uma séria advertência, para não nos deixarmos levar por esse tipo de prática, a qual em nada se apoia na Palavra de Deus, e sim em costumes supersticiosos e pagãos, que não condizem com a vida que Deus quer para seus filhos.

Deus abençoe você!


segunda-feira, 26 de abril de 2021

Série de estudos na 2ª Epístola do Apóstolo Pedro - 4ª parte

  por: José Augusto de Oliveira Maia

26/04/2021


Esta série de estudos foi ministrada pelo autor deste artigo na Igreja Batista de Pinheiros, na classe de discipulado chamada Classe Beta, para novos convertidos, entre o final de 2020 e o início de 2021.

A NEGAÇÃO DA VERDADE PELOS FALSOS MESTRES

No segundo capítulo da 2ª epístola de Pedro, nós estudamos sobre os falsos mestres, cujas falsas doutrinas eles proclamam como se fossem a Palavra de Deus; vimos que sua motivação é a cobiça material, seu método é a invenção de estórias, e seu objetivo é explorar materialmente aqueles que os ouvem; os falsos mestres praticam tudo isso em oposição ao ministério dos apóstolos, que sacrificaram suas vidas voluntariamente em testemunho de Cristo e do Evangelho, sendo testemunhas oculares do ministério e da glória do Senhor, trabalhando para sustentar a si mesmos e aos outros, enquanto desenvolviam seus ministérios.

Agora, Pedro prossegue (II Pedro 3:1, 2), apelando mais uma vez à memória dos leitores sobre as palavras dos profetas e o ensino dos apóstolos.

Pedro aponta para um outro engano (II Pedro 3:3, 4), que estava sendo semeado por aqueles que negavam a 2ª vinda do Senhor, argumentando que o mundo segue sempre igual ao longo dos séculos.

Assim, o apóstolo opõe-se a este argumento (II Pedro 3:5 - 10), relembrando a criação do mundo, e sua destruição pelas águas do Dilúvio, afirmando que, da mesma forma, o mundo em nossos dias, embora apareça absolutamente estável, está guardado para o dia do juízo; a estabilidade pré-Dilúvio não foi garantia de que não haveria um juízo de Deus sobre os pecados da Humanidade, e os tempos que vivemos hoje com a pandemia de Covid-19 são um exemplo da mesma realidade: tudo o que parece ser absolutamente estável e seguro pode desfazer-se de uma hora para a outra (Lucas 17:20 - 30).

O tempo contado por Deus não segue padrões humanos (Salmo 90:4); Deus é eterno, sem princípio nem fim, e é na perspectiva da eternidade que Ele decide seus atos e realiza sua vontade; porém, na perspectiva temporal humana, o tempo presente é dado para arrependimento daqueles rebeldes que se recusam a crer na Palavra de Deus (Romanos 2:4); podemos ter como sólida a certeza das promessas do Senhor quanto à sua segunda vinda e ao juízo final (Marcos 13:32 - 37).

E assim, no próximo e último estudo desta série, veremos as implicações disso para a vida cristã prática.   



segunda-feira, 29 de março de 2021

Série de estudos na 2ª Epístola do Apóstolo Pedro - 3ª parte

 por: José Augusto de Oliveira Maia

29/03/2021


Esta série de estudos foi ministrada pelo autor deste artigo na Igreja Batista de Pinheiros, na classe de discipulado chamada Classe Beta, para novos convertidos, entre o final de 2020 e o início de 2021.

O CUIDADO COM OS FALSOS MESTRES

No capítulo 1, o apóstolo Pedro trata do crescimento na fé e no conhecimento de Deus e de Jesus; a preciosa fé deve ser preservada por aqueles que a receberam, confiantes na autoridade das Escrituras como Palavra de Deus divinamente inspirada; essa Palavra cumpriu-se na pessoa de Cristo, conforme o testemunho dos apóstolos, Pedro entre eles, e este cumprimento foi a base do ensino apostólico, desfrutando da mesma autoridade das demais Escrituras.

Agora, (II Pedro 2:1 - 3), Pedro alerta seus leitores contra falsos profetas do passado e falsos mestres existentes em sua época, em oposição aos profetas inspirados por Deus no passado, e aos apóstolos que Jesus instituiu para o ensino da Igreja; o ensino destes falsos mestres constitui uma negação do Evangelho da Graça, introduzindo uma fé oposta àquela que os discípulos receberam. Pedro alerta que esses falsos mestres serão destruídos de repente, embora muitos venham a ser iludidos por eles, e promoverão escândalos ao ponto de o Caminho da Verdade ser difamado.

Há três marcas que identificavam os falsos mestres:

a) Eram motivados pela cobiça (NVI), termo que pode ser encontrado em outras traduções como "avareza" ou "sórdida ganância"

b) O método usado pelos falsos mestres era o uso de estórias inventadas, ou conforme outras traduções, "palavras fictícias" ou "lendas e artimanhas"; cabe ressaltar que isto nada tem a ver com as parábolas que Jesus criava para ilustrar seus ensinos; Pedro menciona as estórias inventadas pelos falsos mestres como um contraponto ao ensino dos apóstolos, baseado em seu testemunho ocular e pessoal, enquanto que as narrativas dos falsos mestres eram apresentadas por eles como verdadeiras, mas desprovidas do mesmo testemunho

c) O objetivo destes falsos mestres era de explorar, ou "fazer comércio dos ouvintes"

É muito impressionante vermos as palavras do apóstolo Pedro, que não só se cumpriram ao longo da História, mas também refletem as palavras de Paulo aos presbíteros em Éfeso, cerca de sete anos antes desta carta (Atos 20:29 - 35), e encontram cumprimento exato em nossos dias; chama em especial nossa atenção que, ao contrário dos apóstolos, (II Pedro 1:16), o ensino destes falsos mestres baseia-se em estórias inventadas; nada do que eles falam tem o peso da autoridade da Palavra de Deus, nem do ensino e testemunho apostólico; e o objetivo é exatamente o que vemos hoje, com a exploração comercial da boa-fé alheia, manipulada pelo engano, ao contrário do que os verdadeiros apóstolos de Cristo faziam (I Tessalonicenses 2:5; I Timóteo 6:3 - 5).

Tratando do castigo que aguarda estes falsos mestres (II Pedro 2:4 - 10a), Pedro cita 3 exemplos: os anjos que se rebelaram contra Deus, os ímpios contemporâneos de Noé e as cidades de Sodoma e Gomorra; tanto os falsos mestres quanto seus seguidores estão sob o justo juízo de Deus, pois "rejeitam a autoridade" da Palavra de Deus, e correm atrás do ensino que apoia sua vida de impiedade (II Timóteo 4:1 - 4).

Com base nesses exemplos, Pedro fala mais acerca dos falsos mestres e seus seguidores, e do fim que lhes espera (II Pedro 2:10b - 22); um aspecto merece destaque: por vezes, esses falsos mestres e seus discípulos são encontrados na comunhão da igreja local; eles fazem exatamente o que está escrito em II Pedro 2:19: prometem liberdade aos que os seguem, mas são escravos da corrupção.

Portanto, meus irmãos, o cuidado que devemos ter com falsos mestres e falsas doutrinas é realmente muito grande; e no restante desta série, falaremos mais um pouco sobre eles, e sobre o fim que lhes está preparado.  

  



terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Série de estudos na 2ª Epístola do Apóstolo Pedro - 2ª parte

 por: José Augusto de Oliveira Maia

23/02/2021


Esta série de estudos foi ministrada pelo autor deste artigo na Igreja Batista de Pinheiros, na classe de discipulado chamada Classe Beta, para novos convertidos, entre o final de 2020 e o início de 2021.


PRESERVANDO O TESTEMUNHO DE CRISTO

Em II Pedro 1:12 - 21, o apóstolo dá continuidade à sua carta, iniciando com o termo "Por isso" (NVI); outras versões usam "Por esta razão" (ARA) ou "Pelo que" (ARC); ou seja, devido à necessidade de crescimento espiritual dos filhos de Deus, com base exclusivamente na fé no Evangelho de Cristo, Pedro declara sua intenção e cuidado de sempre recordar seus ensinamentos aos irmãos, apesar de saber que eles estão "solidamente firmados na verdade que receberam"; esta preocupação torna-se maior, sabendo que ele não estará mais entre eles. Até onde nos é possível saber, Pedro foi martirizado sob as ordens de Nero, não muito após escrever esta carta(1) (João 21:18, 19). Pedro deseja que, mesmo após a sua morte ("partida" - NVI), seus ensinamentos fiquem marcados no coração e na mente dos discípulos nas várias igrejas para as quais escreve.

Com esta preocupação, nos versículos 16 a 18 ele destaca a origem dos ensinamentos que entregara aos discípulos, não baseados em estórias inventadas, mas fruto de sua própria convivência com Jesus, presenciando os sinais milagrosos que Ele fez, os quais conferiam autoridade aos Seus ensinamentos, e o testemunho da manifestação gloriosa de Jesus, compartilhado por Tiago e João (Mateus 17:1 - 8).

Com base na manifestação gloriosa de Jesus que ele presenciara, Pedro afirma sua plena confiança na palavra dos profetas do Antigo Testamento, os quais profetizaram sobre Cristo e Sua obra; e exorta seus leitores a prestarem atenção àquelas profecias, "como uma candeia que brilha em lugar escuro"; a autoridade daquela palavra é afirmada na declaração dos versículos 20 e 21: "Antes de mais nada, saibam que nenhuma profecia da Escritura provém de interpretação pessoal, pois jamais a profecia teve origem na vontade humana, mas homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo.".

Assim, Pedro insiste com seus leitores que não desprezem o depósito de fé que receberam, ou seja, tudo aquilo que os apóstolos lhes ensinaram, pois a vida deles só poderia estar firme e segura pela fé no Evangelho, na pessoa e na obra de Cristo, que não era qualquer ensino, mas a verdadeira Palavra de Deus.  

Dias difíceis para os discípulos do Senhor estavam se aproximando, com a perseguição promovida por Nero contra eles; a autoridade e segurança das Escrituras era e continua sendo a luz e a certeza para os que creem em Cristo.

Nós não estamos vivendo tempos fáceis, comuns e normais no mundo, e essas coisas nos atingem direta ou indiretamente, todos os dias; nós não sabemos o que acontecerá a cada um de nós e a nossas famílias, especialmente àqueles que creem em Cristo; mas devemos nos lembrar do exemplo que os apóstolos deixaram, testemunhando uma fé inabalável em Cristo, selando essa fé com o próprio sangue, uma vez que sabiam que Aquele de quem testemunhavam e Sua mensagem eram a Verdade de Deus; baseados nesse testemunho, devemos manter nossa fé firme em Cristo (Lucas 21:12, 13; I Pedro 4:12 - 19). 

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(1) - SANTOS, João Batista Ribeiro "Dicionário Bíblico" - Ed. Didática Paulista - 2006 - pág. 388


 


domingo, 31 de janeiro de 2021

Série de estudos na 2ª Epístola do Apóstolo Pedro - 1ª parte

 por: José Augusto de Oliveira Maia

31/01/2021


Esta série de estudos foi ministrada pelo autor deste artigo na Igreja Batista de Pinheiros, na classe de discipulado chamada Classe Beta, para novos convertidos, entre o final de 2020 e o início de 2021.


INFORMAÇÕES INICIAIS

Esta é a segunda carta do apóstolo Pedro, cuja intenção, segundo ele, é relembrar aos destinatários ensinamentos já recebidos anteriormente (II Pedro 1:12; 3:1, 2); sendo assim, os destinatários desta segunda carta seguramente são os mesmos da primeira: comunidades cristãs nas regiões do Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia (I Pedro 1:1).










II Pedro 1:1 - 11

A expressão usada pelo apóstolo que mais chama nossa atenção no início desta carta é "pleno conhecimento"; em II Pedro 1:2, o pleno conhecimento de Deus e de Jesus é apresentado como o meio pelo qual recebemos de Deus, de maneira multiplicada, graça e paz; já em II Pedro 1:3, o pleno conhecimento "daquele que nos chamou para sua própria glória e virtude" é o meio através do qual o poder de Deus nos dá "tudo de que necessitamos para a vida e para a piedade".

Já nestes três primeiros versículos, vemos então a importância que o nosso conhecimento de Deus e de Cristo tem para a vida cristã prática: é através dele que recebemos de Deus graça, paz e capacitação para uma vida piedosa; esse conhecimento deve ser buscado através do estudo da Palavra de Deus, na qual Ele se revela para nós, e da vivência com o Senhor em nossas vidas. 

Esta operação de Deus em nós tem por objetivo tornar-nos participantes da natureza divina, e nos preservar da corrupção do mundo (II Pedro 1:4).

Ao iniciar esta carta, Pedro refere-se aos destinatários como "aqueles que, mediante a justiça de nosso Deus e Salvador Jesus Cristo, receberam conosco uma fé igualmente valiosa"; tendo recebido esta fé como ponto de partida, há uma vida de comunhão com Deus e testemunho ao mundo a ser construída sobre ela; é este o ponto que Pedro desenvolve entre os versículos 5 e 7.

Virtude: conforme os comentaristas Bruce e Green, esta característica da vida cristã é bem interpretada como retidão moral e bondade prática; nossa vida deve ser conduzida em afastar-se do pecado e na prática do bem, refletindo o caráter de Cristo(1).

Conhecimento: sabedoria que aprende de Cristo, através do estudo da Palavra, a praticar a vontade de Deus.

Domínio Próprio: o controle das próprias paixões nasce e se desenvolve a partir do conhecimento transformador da vontade de Deus; não só um conhecimento intelectual, mas um conhecimento que é usado pelo Espírito Santo para produzir uma transformação gradual em nós, ao contrário dos falsos mestres que Pedro denuncia mais adiante na carta (II Pedro 2:10; 3:3).

Perseverança: fruto da confiança nas promessas de Deus, ajuda-nos a superar dificuldades externas e também os fracassos pessoais; falhamos sim, mas apesar de nossas falhas, depositamos nossa confiança nas promessas de Deus e seguimos buscando o seu reino em nossas vidas.

Piedade: ainda citando os comentaristas Bruce e Green, reflete-se em uma vida marcada pelo temor a Deus e respeito ao próximo(2).

Fraternidade: amor pelos irmãos que professam a mesma fé em Cristo, e vivem a mesma experiência da nova criação de Deus em nós.

Amor: a origem do amor de Deus por nós, manifestado no sacrifício de Cristo, está no próprio Deus, que é amor, e não em nós, criaturas caídas e rebeldes, que não podemos inspirar amor; este amor é o que Deus quer reproduzir em nós, que devemos amar ao próximo de forma prática, sacrificial e independente de quem seja, como testemunho ao mundo do amor de Deus.

O versículo 8 conclui que uma fé real se desenvolve pelo acréscimo destas qualidades, impedindo que os filhos de Deus tenham uma vida cristã prática inoperante e improdutiva (Tiago 2:26); o contrário também é verdadeiro, (versículo 9), demonstrando uma fé morta. Porém, é importante considerarmos que essa evolução na fé não é linear, um sempre avançar sem recuos, tropeções e quedas; nossa natureza pecaminosa ainda está presente em nós, e a luta entre a nossa natureza humana e o nosso espírito seguirá constante enquanto vivermos nesta realidade material contaminada pelo pecado (Romanos 7:22, 23; Gálatas 5:17; Filipenses 3:1 - 14); por isso, a perseverança se dá por depositarmos nossa confiança nas promessas de Deus, e não em nossos próprios esforços.

Assim, nos versículos 10 e 11, vemos que o chamado que recebemos de Deus deve ser consolidado, não baseado em progresso moral pelo esforço humano, mas no alicerce da fé conforme o Evangelho de Cristo (I Coríntios 15:2; Colossenses 1:21 - 23); sem esta fé, se nossa esperança de resultados for depositada em nosso esforço pessoal, a vida será uma sequência de frustrações, e terminará em desespero, devido à nossa incapacidade de cumprirmos os padrões de Deus.

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(1) - BRUCE, F. F. "Comentário Bíblico NVI" - tradução Valdemar Kroker - Editora Vida - 2ª edição, 2012 - página 1.488; GREEN, Michael "2Pedro e Judas - introdução e comentário" - tradução Gordon Chown - Editora Vida Nova - 1ª edição, 1983, reimpressão 2011 - página 64

(1) - BRUCE, F. F. "Comentário Bíblico NVI" - tradução Valdemar Kroker - Editora Vida - 2ª edição, 2012 - página 1.488; GREEN, Michael "2Pedro e Judas - introdução e comentário" - tradução Gordon Chown - Editora Vida Nova - 1ª edição, 1983, reimpressão 2011 - página 66





 


sábado, 25 de julho de 2020

Apócrifos, pseudepígrafos e pseudonímicos



por:
José Augusto de Oliveira Maia
25.07.2020


INTRODUÇÃO

Este texto tem por objetivo tratar, do ponto de vista teológico, sobre o que são textos apócrifos, pseudoepígrafos e peseudonímicos; sobre o surgimento de apócrifos no Antigo Testamento (AT) e Novo Testamento (NT) na Bíblia; e destacar, ainda que sucintamente, a importância do processo canônico do Novo Testamento.

DEFININDO

A definição do exato significado dos termos "apócrifo", "pseudepígrafo" e "pseudonímico" parece, pelas leituras que fiz para redação deste artigo, muito complexa para discutirmos aqui; dessa forma, apresentarei os conceitos de uma forma mais genérica, apenas o suficiente para atender os objetivos deste artigo.

O termo "pseudonímico", de acordo com o dicionário eletrônico "Michaelis on-line", está ligado à palavra "pseudonímia", que significa "Ocultação de autoria de obra literária ou artística, utilizando-se um nome falso"(1); ou seja, um texto, um livro pseudonímico é um texto cujo nome do real autor foi substituído por um outro, que inclusive, pode ser reconhecido e famoso, recurso utilizado para dar ao texto confiabilidade, respeitabilidade e autoridade.

O termo "pseudepígrafo", ainda segundo a mesma fonte, aplica-se a textos bíblicos cujo título ou o nome do autor são considerados falsos(1); a mesma designação encontramos no livro "Apócrifos e pseudo-epígrafos da Bíblia", organizado por Eduardo de Proença e publicado pela editora Fonte Editorial(2).

Por sua vez, o termo "apócrifo" aparece no Michaelis como "texto religioso que carece de autoridade canônica"(1), ou seja, um texto não reconhecido como fazendo parte oficialmente do cânon da Bíblia, a lista de textos que compõem o AT e o NT. Por outro lado, D. H. Wallace define o sentido do termo como sendo "'as coisas ocultas', embora não haja nenhum sentido rigoroso no qual estes livros estejam ocultos (...) no sentido mais amplo, a palavra refere-se a qualquer trecho extracanônico."(3); é neste último sentido que usaremos o termo neste artigo.

UM POUCO DE HISTÓRIA

Sobre os livros apócrifos do AT, originalmente eles não faziam parte dos livros aceitos pela comunidade judaica, ainda nos tempos anteriores a Cristo, em sua língua original, o hebraico; os textos assim designados pelos judeus passaram a ser incluídos nessa relação de livros a partir da versão grega do AT., chamada Septuaginta, como um acréscimo. 

Já nos tempos após o ministério terreno de Jesus Cristo, a partir do século II, alguns textos começaram a aparecer entre as comunidades cristãs, além daqueles textos que já existiam desde o século I, escritos pelos apóstolos de Cristo ou por alguém próximo a eles; possivelmente, dois motivos estão por trás do surgimento destes novos textos:

a) curiosidades sobre a infância e juventude de Jesus e sobre a pessoa dos apóstolos

b) falsos mestres querendo impor seus ensinamentos à comunidade cristã, valendo-se dos nomes dos apóstolos como autores dos textos, conferindo-lhes uma suposta autoridade apostólica

A forma literária destes textos é semelhante à dos textos do NT, sejam evangelhos, cartas, atos (como Atos dos Apóstolos) e apocalipses; no entanto, a qualidade dos textos é sofrível; vale aqui a oportunidade de destacarmos o comentário de H. F. Vos:

"Tendências heréticas, crenças e superstições estão escritas de modo marcante nestas obras. Pode-se discernir que os ensinamentos sobre a graça ficam para trás, havendo uma ascensão correspondente do legalismo, uma crescente veneração por Maria e um aumento no valor dos sacramentos. Além disso, um estudo destas obras apócrifas demostrará a superioridade dos livros do NT, tanto no conteúdo quanto na forma, e aumentará nosso respeito para com o cânon e para com a validez do processo canônico."

Dentre aqueles falsos mestres do século II, vale destacar um grupo especial que eram os gnósticos; havia várias correntes de pensamento entre os gnósticos, de forma que é difícil uma definição resumida e precisa sobre o grupo; mas alguns de seus ensinos fundamentais e mais populares eram francamente opostos à fé cristã, dos quais podemos destacar(5):

i) toda a matéria é má, em oposição ao espírito, que é sempre bom

ii) o Ser Supremo não teria criado este mundo material, mas apenas um mundo espiritual; um ser espiritual inferior teria criado o mundo material, à revelia do Ser Supremo

iii) uma hierarquia de seres espirituais seria o elo de ligação entre o mundo material corrupto e o mundo espiritual puro

iv) um conhecimento espiritual é necessário para que nosso espírito seja salvo da matéria corrupta que o prende; este conhecimento especial seria trazido por um mensageiro dentre os seres espirituais; daí o termo gnosticismo (grego gnosis = conhecimento ou ciência)

Havia textos divulgados pelos gnósticos como supostamente de autoria dos apóstolos; um texto que tive a oportunidade de ler é o Evangelho segundo Felipe, do qual reproduzo alguns trechos aqui(6).

"A luz e as trevas, a vida e a morte, os da direita e os da esquerda são irmãos entre si, sendo impossível separar uns dos outros. Por isso nem os bons são bons, nem os maus são maus, nem a vida é vida, nem a morte é morte. Assim é que cada um virá a dissolver-se em sua própria origem desde o princípio; mas os que estão além do mundo são indissolúveis e eternos." (mas compare com Mateus 25:31 - 33)

"O mundo foi criado por culpa de uma transgressão, pois aquele que o criou queria fazê-lo imperecível e imortal mas caiu e não pôde realizar suas aspirações. De fato não havia incorruptibilidade nem para o mundo nem para quem o havia criado, já que incorruptíveis não são as coisas, mas os filhos, e nenhuma coisa poderá ser perdurável a não ser que se faça filho, pois como poderá dar quem não está com disposição para receber?" (isso dá um nó no cérebro!)

"Quem recebeu a faculdade de criar é uma criatura; quem recebeu a de engendrar é um engendrado. Quem cria não pode engendrar, quem engendra não pode criar. Costuma dizer-se que 'quem cria engendra', mas o que engendra é uma criatura." (notem a contradição evidente!)

Pelos exemplos acima, acredito que o leitor e a leitora irão perceber por quê razão textos como este jamais poderia fazer parte do Novo Testamento; com a licença de vocês, digo que a comunidade cristã dos primeiros séculos fez muito bem em rejeitar este lixo!

Com o tempo, estudiosos cristãos da época foram criando listas dos textos que eram aceitos de forma geral pelas comunidades cristãs em seus cultos, como Orígenes de Alexandria (185 - 254), Eusébio de Cesareia (265 - 339), como forma de buscar uma definição dos textos que eram aceitos como canônicos, e rejeitar os que não poderiam receber esse reconhecimento; finalmente, em 367, o bispo Atanásio (295 - 373), da igreja de Alexandria, em sua Carta de Páscoa, relacionou os textos que até hoje são incluídos no NT. Já no ano 397, o Sínodo de Cartago definiu o cânon do NT como temos hoje, mas reconheceu os apócrifos do AT como próprios para leitura, apesar da resistência de Jerônimo (340 - 420), presbítero da cidade de Antioquia e organizador da versão em latim da Bíblia.

Já no século XVI, o Concílio de Trento (1.548 - 1.563), organizado pela Igreja Católica, aceitou como canônicos os apócrifos do AT; mas de forma geral, os líderes da Reforma Religiosa do século XVI (Lutero, Calvino, Zwinglio e outros) rejeitaram o status canônico destes textos; algumas edições das Bíblias protestantes incluíram estes textos, embora ressalvando que não eram canônicos; a partir de 1.827, a Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira passou a excluir os apócrifos de suas Bíblias(7).

LISTAS DOS APÓCRIFOS NO AT E DO NT

ANTIGO TESTAMENTO
   
III e VI Esdras
Tobias
Judite
Restante de Ester
Sabedoria de Salomão
Eclesiástico (ou Sabedoria de Jesus, filho de Siraque)
Baruque
Carta de Jeremias
Acréscimos a Daniel
Oração de Manassés
I e II Macabeus

NOVO TESTAMENTO

Proto-evangelho de Tiago
O evangelho de pseudo-Mateus
O evangelho da natividade de Maria
A história de José, o carpinteiro
O evangelho segundo Tomé
O evangelho árabe da infância
O evangelho segundo Nicodemus
O evangelho segundo Felipe
O evangelho dos egípcios
Atos de Paulo
Atos de Pedro
Atos de André
Atos de João
Atos de Tomé
Epístola dos Apóstolos
Epístola aos Laodicenses
III Coríntios
Cartas de Paulo a Sêneca
Apocalipse de Pedro
Apocalipse de Paulo


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(1) - www.michaelis.uol.com.br (acessado em 25.07.2020)

(2) - PROENÇA, Eduardo de (org.) "Apócrifos e pseudo-epígrafos da Bíblia", trad. Claudio J. A. Rorigues, editora Fonte Editorial, 2005, prefácio

(3) - WALLACE, D. H. in Elwell, Walter A. "Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã", trad. Gordon Chown, editora Vida Nova, 2009, vol.1 página 95

(4) - VOS, H. F. in Elwell, Walter A. "Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã", trad. Gordon Chown, editora Vida Nova, 2009, vol.1 página 97

(5) - MAIA, José Augusto de Oliveira "A Fé Cristã - sua história e seus ensinos", publicado por Clube de Autores, 2012, página 56  https://clubedeautores.com.br/livro/a-fe-crista

(6) - PROENÇA, Eduardo de (org.) "Apócrifos e pseudo-epígrafos da Bíblia", trad. Claudio J. A. Rorigues, editora Fonte Editorial, 2005, páginas 620, 631, 634

(7) - MAIA, José Augusto de Oliveira "Para você, que ainda não conhece a Bíblia", publicado por Clube de Autores, 2017, página 143; WALLACE, D. H. in Elwell, Walter A. "Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã", trad. Gordon Chown, editora Vida Nova, 2009, vol.1 páginas 95, 96 https://clubedeautores.com.br/livro/para-voce-que-ainda-nao-conhece-a-biblia


terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

E se Isaque tivesse abençoado Esaú?


por:
José Augusto de Oliveira Maia
09.02.2020


Ouvi há poucos dias a questão, título deste artigo, ser formulada por um pastor: "E se Isaque tivesse abençoado Esaú?" O ponto que me preocupou não foi tanto a pergunta, mas a resposta, ainda que elaborada superficialmente, apresentada pelo pastor; e, segundo ele, se isso tivesse acontecido, Deus teria abençoado os descendentes de Esaú, e não a nação de Israel, descendentes de seu irmão, Jacó.

Confesso que fiquei horrorizado com essa resposta; e, profundamente entristecido com o erro doutrinário contido nela, decidi escrever este artigo, para deixar claro o que a Palavra de Deus ensina.

O contexto do nascimento de Esaú e Jacó

Em Gênesis 25:19 - 26, lemos a história da concepção e do nascimento de Esaú e Jacó; Rebeca, incomodada pela agitação constante entre as crianças ainda não nascidas, foi consultar o Senhor (v. 22); e a resposta de Deus, clara como água, foi que "o mais velho servirá ao mais novo" (v. 23).

Chegada a hora do parto, nasce o primeiro, o mais velho, que recebe o nome de Esaú, e depois seu irmão, mais novo, cujo nome ficou sendo Jacó (vs. 25 e 26).

Portanto, pelo relato acima, fica evidente que Deus de antemão decidira escolher Jacó, posteriormente designado por Deus como Israel (Gênesis 32:22 - 28), em lugar de Esaú, o filho mais velho, como herdeiro das promessas feitas a Abraão, seu avô (Gênesis 12:1 - 3; 13:14 - 17; 15:1 - 5), e continuador de sua descendência.

Com isto concordam as Escrituras, como encontramos em Malaquias 1:1 - 3, texto citado por Paulo em Romanos 9:11 - 13: "Amei Jacó, mas rejeitei Esaú".

Assim, o primeiro ponto a ressaltarmos aqui é que a escolha e a benção de Deus sobre Jacó em detrimento de Esaú dependeram exclusivamente da soberana vontade de Deus, e não de esforços ou esquemas humanos.

Isaque - o desejo de abençoar Esaú


Recorrendo ao teólogo F. F. Bruce em seu "Comentário Bíblico NVI"(1), encontramos a afirmação de que "as orientações de um moribundo tinham força de lei na cultura daqueles dias"; ainda segundo Bruce, o esquema planejado por Rebeca e executado por ela e Jacó recebeu como castigo o afastamento definitivo entre mãe e filho, os quais nunca mais se reencontraram.

Ainda recorrendo a outro comentarista, Derek Kidner(2) ressalta a responsabilidade de Isaque, mesmo sabedor do oráculo pré-natalício dos gêmeos em favor de Jacó, em tentar manter sua benção paternal sobre Esaú; de igual forma, tanto Rebeca quanto Jacó carregam sua parcela de culpa, adotando uma atitude desprovida de fé na promessa de Deus e de amor pelo patriarca; quanto a Esaú, que já vendera com juramento seu direito à primogenitura para Jacó (Gênesis 25:29 - 34), aceitou a proposta do pai, quebrando seu juramento.

De qualquer forma, embora o desejo do pai de abençoar o filho primogênito, conforme a tradição do patriarcado sob o qual a família vivia, fosse legítimo, devemos considerar que tanto Isaque quanto Rebeca conheciam há muitos anos a vontade expressa de Deus sobre o assunto, e a obediência humilde de Isaque tornaria desnecessária a armação de Rebeca; por outro lado, ressaltando o que já tratamos na primeira parte deste artigo, a vontade de Deus seria cumprida de qualquer forma.

Destacamos, portanto, como segundo ponto fundamental, que não foi o esquema armado por Rebeca, nem a oração de Isaque, que garantiram a benção divina sobre Jacó, o qual já contava com ela desde antes de seu nascimento. Porventura, teria Deus a necessidade de uma "ajudazinha" humana para cumprir qualquer um de seus propósitos? (Isaías 43:13)

Os planos de Deus não podem ser impedidos

Mas, e se Isaque houvesse feito, como planejara, a oração de benção sobre Esaú? O que aconteceria? A resposta, simples e clara, é que não aconteceria absolutamente nada.

Em primeiro lugar, e mais importante, Deus já havia determinado abençoar Jacó, e não Esaú, para dar continuidade à descendência de Abraão, de onde viria o Cristo, humanamente falando; Deus não mudaria seus propósitos, nem alteraria seus planos; se assim fosse, jamais poderíamos descansar na fidelidade de Deus (Malaquias 3:6).

Em segundo lugar, Deus não precisa do Homem para qualquer coisa que seja; ainda que Deus use as pessoas, como usou servos do passado como Moisés, Davi ou Jeremias, Ele se basta a si mesmo; assim, o esquema montado por Rebeca e executado por Jacó não teve qualquer influência para os planos de Deus; Ele havia escolhido Jacó, Sua benção estava com ele, e nada mudaria isso (Números 23:8, 19, 20).

E, em terceiro e último lugar, se Isaque houvesse abençoado Esaú, não seria a oração de benção que obrigaria Deus a mudar seus planos; pense que situação ridícula, Deus ter decidido antes do nascimento dos gêmeos abençoar Jacó, e depois ser pego totalmente de surpresa pela oração de Isaque, que O comprometeria a mudar Sua determinação, rejeitar Jacó e abençoar Esaú; este não seria o Deus da Bíblia.

A soberania de Deus é imutável; portanto, podemos declarar sem dúvida que a benção de Deus sobre Jacó não dependeu do esquema de Rebeca, nem seria afetada pela oração de Isaque, mas estava absolutamente determinada pelo propósito eterno de Deus (Salmo 33:10, 11).



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(1) - BRUCE, F. F. "Comentário Bíblico NVI" - tradução Valdemar Kroker - Editora Vida - 2ª edição, 2012 - página 139

(2) - KIDNER, Derek "Gênesis - introdução e comentário" - tradução Odayr Olivetti - Editora Vida Nova - 1ª edição, 1979; reimpressão, 2011 - página 144








sexta-feira, 20 de setembro de 2019

A rebelião de Satanás no céu



por:
José Augusto de Oliveira Maia
20/09/2019


"Satanás para tirar os anjos do céu fez eles enxergarem defeitos no céu, para ele tirar você da igreja fará você ver defeitos na igreja."

Essa frase, que li outro dia no Facebook, possui duas afirmações; uma delas, verdadeira e muito importante; a outra, biblicamente falsa; embora a falsidade de uma não invalide a verdade de outra, sua falsidade semeia perigosos erros em relação às doutrinas da Palavra de Deus, a Bíblia.

A IMPORTÂNCIA DA COMUNHÃO CRISTÃ E BÍBLICA

Sim, é verdade que Satanás quer nos afastar do caminho da salvação, Jesus Cristo; sim, é verdade que um dos meios para fazer isso é afastar a pessoa da Igreja, fazendo-a ver defeitos na comunidade local, alguns bem reais, outros apenas imaginários...

Sim, a Palavra de Deus, a Bíblia, nos exorta a permanecermos em comunhão com uma comunidade local de pessoas fiéis ao Senhor Jesus, como forma de nos fortalecermos mutuamente na fé em Deus e em Seu Filho, Jesus Cristo (Hebreus 10:24, 25); por isso, o amor fraternal, a tolerância com as diferenças que não conduzam à rebelião contra Deus, e a prontidão no socorro e nas orações uns pelos outros devem estar sempre presentes entre nós (João 13:34,35; Romanos 12:10; Efésios 4:25 - 32; I Pedro 4:8 - 10).

A REBELIÃO DE SATANÁS NO CÉU

Não, em hipótese alguma Satanás fez qualquer tipo de campanha para que os anjos cansassem do céu e quisessem sair de lá; "Vamos embora, vamos sair daqui, deve haver um lugar melhor para vivermos"; não, a Palavra de Deus não ensina isso.

O que a Palavra de Deus nos ensina é que Satanás se rebelou contra Deus, buscando fazer-lhe oposição e ser igual a Deus (Apocalipse 12:7 - 9; confira também II Tessalonicenses 2:3 - 9); foi neste mesmo sentido a tentação da serpente contra Eva no Jardim do Édem (Gênesis 3:4, 5), e a tentação contra Jesus (Mateus 4:8, 9); nesta mesma direção segue a sentença do profeta Isaías contra o rei da Babilônia [possivelmente Sargão II, morto em 705 a. C., conforme F. F. Bruce](1); e, conforme J. Ridderbos, citando Isaías 14:14, "mediante a sua autodeificação, o rei da Babilônia é imitador do diabo e um tipo de anticristo; portanto, a sua humilhação é um exemplo da queda de Satanás da posição de poder que ele usurpou."(2)

CUIDADO COM OS ERROS!!!

A errônea afirmação que Satanás queria tirar os anjos do céu implica em pelo menos dois ensinamentos falsos:

* compreender que não era desejo de Satanás permanecer no céu; pelo contrário: seu pensamento e suas intenções estão em oposição a Deus, querendo para si uma glória e uma posição que não lhe pertencem; frustrado nesse objetivo, Satanás tenta os seres humanos a cair na mesma rebelião contra Deus e no mesmo erro que motivou sua expulsão do céu.

* compreender que a saída de Satanás e dos anjos que o seguiram do céu foi voluntária; nada mais falso; a verdadeira causa de sua saída do céu foi sua rebelião contra Deus, e sua consequente expulsão pelos exércitos celestiais.

Cuidado com as frases aparentemente cheias de espiritualidade; nosso pensamento deve ser levado cativo à obediência a Cristo, segundo as Escrituras Sagradas (II Coríntios 10:5).

Que Deus nos abençoe! Soli Deo gloria!!
_______________
(1) - BRUCE, F. F. "Comentário Bíblico NVI" - Ed. Vida Acadêmica - trad. Valdemar Kroker - 2ª edição, 2012 - página 705

(2) - RIDDERBOS, J. "Isaías - introdução e comentário" - Ed. Vida Nova - trad. Adiel Almeida de Oliveira - 2ª edição, 1995; reimpressão, 2011 - página 149


quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Serie de estudios "Cristianismo y Liberalismo" - parte 9 y última


por:
José Augusto de Oliveira Maia
20.06.2019


En el penúltimo estudio de esta serie, Machen(1) contrasta la doctrina cristiana sobre la salvación de las almas con las enseñanzas liberales sobre el tema; mientras que los teólogos y pastores liberales enseñan confianza en la capacidad humana para construir un mundo mejor al reducir el sacrificio de Cristo a un mero buen ejemplo, la predicación cristiana proclama la muerte de Cristo como el sacrificio por la redención de la humanidad, por el cual el amor de Dios, el Padre, por la humanidad realiza su justicia sobre la persona de Dios, el Hijo, pagándose el precio requerido para nuestra reconciliación con Dios.

En este último estudio, analizaremos las dificultades que enfrentan los cristianos contra la invasión de las iglesias por parte de los liberales, y los riesgos que esto nos trae hasta el día de hoy.

LIBERALISMO TEOLÓGICO - DEL SEMINARIO PARA EL PÚLPITO

Los principios liberales presentados en la primera parte de nuestra serie - a) rechazo de la autoridad de la Biblia como la Palabra de Dios; b) la inmanencia de Dios en el individuo humano; c) la paternidad universal de Dios; d) negación del nacimiento virginal de Cristo, sus milagros y su resurrección corporal; e) escatología que se cumple en la evolución del hombre hasta la salvación de la sociedad, negando el juicio sobre la creación como se enseña en el Apocalipsis de Juan -  se desarrollaron a lo largo del siglo XIX e invadieron seminarios teológicos a principios de siglo XX; varios pastores entrenados en estos seminarios llevaron sus enseñanzas a los púlpitos de sus iglesias mientras trabajaban para excluir a los cristianos ortodoxos, o como se les llamaba, fundamentalistas, de su dirección; el material de la Escuela Dominical se formó de acuerdo con los conceptos de evolución humana y educación religiosa sobre la base de principios liberales, de modo que la formación cristiana, no la conversión a Cristo, era la base de la vida de los futuros miembros de la iglesia(2).

Este es precisamente el punto, y sus consecuencias negativas para el Reino de Dios, la causa del Evangelio de Cristo y la Iglesia de Cristo y las denominaciones cristianas, que Machen aborda en el último capítulo de su libro.

LA PATERNIDAD DE DIOS Y LA HERMANDAD CRISTIANA

Este es un punto fundamental sobre el cual los cristianos y los liberales no pueden ponerse de acuerdo; mientras que el liberalismo teológico (LT), basado en principios humanistas y de iluminación, afirma que todos somos hermanos e hijos de Dios, el cristianismo basado en la Biblia reconoce la dependencia humana de un Creador y la realidad de la misma naturaleza común a todos los Hombres; pero el sentido de hermandad cristiana y la paternidad de Dios es exclusivo de los convertidos a Cristo (Juan 1:10 - 13; 20:31).

Por lo tanto, al contrario del LT, cuya esperanza se basa en la mejora humana en el tratamiento de los asuntos terrenales, el cristianismo pone su esperanza en el nuevo nacimiento, creando un nuevo ser y una nueva hermandad (Juan 3: 3).

CRISTIANOS, LIBERALES Y LA IGLESIA LOCAL

Machen define la iglesia local, institucional y visible como la expresión humana de la iglesia de Cristo, la verdadera compañía de los redimidos; "La iglesia invisible, la verdadera compañía de los redimidos, encuentra su expresión en el compañerismo de los cristianos que constituyen la iglesia visible hoy". (pág. 134); sin embargo, a principios del siglo XX, la comunidad cristiana local / denominacional se había debilitado al aceptar falsos cristianos no solo como miembros, "sino también en el ministerio de la iglesia, y cada vez más se les ha permitido dominar los consejos y determinar sus enseñanzas. La gran amenaza para la iglesia hoy no proviene de sus enemigos externos, sino de sus enemigos internos; proviene de la presencia dentro de la iglesia de personas cuya fe y práctica son completamente anticristianas." (pág. 135).

Hasta este punto en nuestro estudio, se ha demostrado que el cristianismo y el liberalismo no son lo mismo, y como Machen afirmó en su tiempo, "es muy indeseable que el liberalismo y el cristianismo se sigan propagando dentro de los límites de la misma organización. La separación de las dos partes dentro de la iglesia es la necesidad más urgente de este momento." (pág. 135).

La unión buscada por los liberales dentro de la misma iglesia con sus miembros cristianos se basa en ideas frágiles y vulnerables; mientras que los liberales dicen: "Unámonos en la misma congregación, después de todo, las diferencias doctrinales son frívolas", para el cristiano nacido de nuevo, la cruz de Cristo y su mensaje, rechazado por el LT, no es mera frivolidad.

Más allá de las diferencias doctrinales, la actitud deshonesta de los liberales, insistiendo en ser parte de una iglesia y su ministerio, es un peligro para la iglesia; pero esta crítica de Machen no se dirigió contra aquellos que, miembros de las iglesias confesionales, lucharon con sus dudas en busca de la verdad; pero se dirigió a aquellos que "se enorgullecen de la posesión del conocimiento de este mundo y buscan un lugar en el ministerio, donde puedan enseñar lo que es directamente contrario a la confesión de fe a la que se someten." (pág. 138).

Además, los liberales insistieron en permanecer en iglesias históricas y denominacionales como un medio para acceder y manipular sus recursos en la propagación de ideas contrarias a la fe cristiana.

"No es una cuestión de tolerancia, es deshonestidad, para una organización fundada con el propósito fundamental de difundir un mensaje, comprometiendo sus recursos y su nombre con aquellos que están luchando contra ese mismo mensaje." (pág. 142)

LA POSTURA REQUERIDA DE LA IGLESIA

La batalla por la fe cristiana requiere no solo el compromiso de proclamar el Evangelio, sino también la defensa intelectual del Evangelio; "Hubo, antes, grandes crisis en la historia de la Iglesia, crisis casi comparables a esta. Una apareció en el siglo II, cuando la existencia misma del cristianismo fue amenazada por los gnósticos. Otra surgió en la Edad Media, cuando parecía el evangelio de la gracia de Dios había sido olvidado. En tiempos de crisis, Dios siempre ha salvado a la Iglesia. Pero siempre la ha salvado por los obstinados defensores de la verdad, no por los pacifistas teológicos." (pág. 146).

Por otro lado, los candidatos para el ministerio deben ser bien juzgados en su honestidad acerca de adherirse a las doctrinas cristianas fundamentales; la elección de los ministros debe centrarse en su fidelidad a las Escrituras; "La gente ha perecido bajo el ministerio de aquellos que 'no niegan' la cruz de Cristo. Pero se necesita algo más. Dios, envíanos ministros que, en lugar de evitar la negación de la cruz, sean fervientes por la cruz, ¡cuyas vidas son sacrificios de gratitud al bendito Salvador que los amó y se entregó por ellos!" (pág. 147).

Por último, la iglesia debe combatir la ignorancia sobre el cristianismo dentro de sus propias puertas; esta ignorancia "es el resultado lógico e inevitable de la falsa noción de que el cristianismo es un estilo de vida, no una doctrina; si el cristianismo no es una doctrina, la enseñanza obviamente no es necesaria para el cristianismo". (pág. 148); pero, como doctrina, el cristianismo no solo debe ser constantemente proclamado sino también enseñado en sus afirmaciones e implicaciones prácticas.

"Los laicos, así como los ministros, deben volver, con una nueva firmeza, al estudio de la Palabra de Dios en estos días." (pág. 149); no ignoramos los muchos peligros que enfrentamos; pero a pesar de las muchas dificultades enfrentadas, nuestra esperanza reside en las preciosas promesas de Dios.

(1) MACHEN, John Greshan "Cristianismo e Liberalismo" - Shedd Publicações - tradução Caio Cesar Dias Peres - 1ª edição - 2012 (Brasil)

(2) CAIRNS, Earle E. "O cristianismo através dos século" - Ed. Vida Nova - tradução Israel Belo de Azevedo, Valdemar Korker - 2ª edição - 2008 - páginas 466, 484 - 487 (Brasil)


segunda-feira, 24 de junho de 2019

Série de estudos "Cristianismo e Liberalismo" - 9ª e última parte



por:
José Augusto de Oliveira Maia
20.06.2019


No penúltimo estudo desta série, Machen(1) contrapõe a doutrina cristã sobre a salvação das almas aos ensinos liberais sobre o tema; enquanto os teólogos e pastores liberais ensinam a confiança na capacidade humana para a construção de um mundo melhor, reduzindo o sacrifício de Cristo a um mero e bom exemplo, a pregação cristã proclama a morte de Cristo como o sacrifício em prol da redenção da Humanidade, através do qual o amor de Deus Pai pela Humanidade executa Sua justiça sobre a pessoa de Deus Filho, pagando ele mesmo o preço exigido para nossa reconciliação com Deus.

Neste último estudo, veremos as dificuldades enfrentadas pelos cristãos contra a invasão das igrejas pelos liberais, e os riscos que isso traz para nós até o dia de hoje.

LIBERALISMO TEOLÓGICO - DO SEMINÁRIO PARA O PÚLPITO

Os princípios liberais apresentados na primeira parte de nossa série - a) rejeição da autoridade da Bíblia como Palavra de Deus; b) a imanência de Deus no indivíduo humano; c) a paternidade universal de Deus; d) negação do nascimento virginal, dos milagres e da ressurreição corpórea de Cristo; e) escatologia que se cumpre na evolução do Homem, em direção à salvação da sociedade, negando-se o juízo sobre a Criação como ensinado no Apocalipse de João - desenvolveram-se ao longo do século XIX e invadiram os seminários teológicos no início do século XX; diversos pastores formados nestes seminários levaram seus ensinos para os púlpitos de suas igrejas, ao mesmo tempo em que trabalhavam para excluir os cristãos ortodoxos, ou como eram chamados, fundamentalistas, de sua direção; o material das Escolas Dominicais foi formatado segundo conceitos da evolução humana e da educação religiosa com base em princípios liberais, de tal forma que a formação cristã, e não a conversão a Cristo, fosse a base da vida dos futuros membros das igrejas(2).

É justamente este o ponto, e suas consequências negativas para o Reino de Deus, a causa do Evangelho de Cristo e a Igreja de Cristo e denominações cristãs, de que Machen trata no último capítulo de seu livro. 

A PATERNIDADE DE DEUS E A FRATERNIDADE CRISTÃ

Este é um ponto fundamental no qual cristãos e liberais não podem concordar; enquanto o liberalismo teológico (LT), baseado nos princípios humanistas e iluministas, afirma que todos somos irmãos e igualmente filhos de Deus, o cristianismo, fundamentado na Bíblia, reconhece a dependência humana de um único Criador e a realidade de uma mesma natureza comum a todos os Homens; porém, o senso de fraternidade cristã e da paternidade de Deus são exclusivos dos convertidos a Cristo (João 1:10 - 13; 20:31).

Assim, contrário ao LT, cuja esperança se baseia no aprimoramento humano em lidar com as questões terrenas, o cristianismo põe sua esperança no novo nascimento, criando um novo ser e uma nova fraternidade (João 3:3).

CRISTÃOS, LIBERAIS E A IGREJA LOCAL

Machen define a igreja local, institucional e visível como expressão humana da igreja de Cristo, a verdadeira companhia dos remidos; "A igreja invisível, a verdadeira companhia dos redimidos, encontra sua expressão na comunhão dos cristãos que constituem a igreja visível hoje." (pág. 134); porém, no início do século XX, a comunidade cristã local / denominacional vinha se enfraquecendo ao aceitar falsos cristãos não somente como membros, "mas também no ministério da igreja, e, de forma crescente, têm recebido permissão para dominar os concílios e determinar o seu ensino. A grande ameaça à igreja de hoje não vem de seus inimigos externos, e sim dos inimigos internos; vem da presença, dentro da igreja, de pessoas cuja fé e prática são totalmente anticristãs." (pág. 135).

Até este ponto de nosso estudo, ficou demonstrado que cristianismo e liberalismo não são a mesma coisa, e conforme Machen asseverava em sua época, "é altamente indesejável que o liberalismo e o cristianismo devam continuar sendo propagados dentro dos limites da mesma organização. A separação das duas partes dentro da igreja é a necessidade mais premente deste momento." (pág. 135).

A união buscada pelos liberais dentro de uma mesma igreja com seus membros cristãos baseia-se em ideias frágeis e vulneráveis; pois, enquanto os liberais dizem: "Vamos nos unir na mesma congregação, afinal, as diferenças doutrinárias são frívolas", para o cristão novamente nascido, a cruz de Cristo e sua mensagem, rejeitada pelo LT, não é mera frivolidade. 

Além das diferenças doutrinárias, a atitude desonesta dos liberais, insistindo em fazer parte de uma igreja e de seu ministério, é um perigo para a igreja; porém, esta crítica de Machen não era dirigida contra aqueles que, membros das igrejas confessionais, lutavam com suas dúvidas em busca da verdade; mas dirigia-se àqueles que "se orgulham da posse do conhecimento deste mundo, e buscam um lugar no ministério, onde possam ensinar o que é diretamente contrário à confissão de fé à qual se submeteram." (pág. 138).

Além disso, os liberais insistiam em permanecer nas igrejas históricas e confessionais como forma de acessar e manipular seus recursos na propagação de ideias contrárias à fé cristã.

"Não é uma questão de tolerância e sim de desonestidade, para uma organização fundada com o propósito fundamental de propagar uma mensagem, comprometer seus recursos e seu nome com aqueles que estão engajados em combater essa mesma mensagem." (pág. 142)

A POSTURA NECESSÁRIA À IGREJA

A batalha pela fé cristã necessita não só do empenho na proclamação do Evangelho, mas também na defesa intelectual do Evangelho; "Já houve, anteriormente, grandes crises na história da igreja, crises quase comparáveis a essa. Uma apareceu no século II, quando a própria existência do cristianismo foi ameaçada pelos gnósticos. Outra surgiu na Idade Média, quando o evangelho da graça de Deus parecia ter sido esquecido. Em tempos de crise, Deus sempre salvou a igreja. Mas ele sempre a salvou pelos teimosos defensores da verdade, e não pelos pacifistas teológicos." (pág. 146).

Por outro lado, os candidatos ao ministério devem ser bem avaliados em sua honestidade quanto à aderência às doutrinas cristãs fundamentais; a escolha dos ministros deve centrar-se em sua fidelidade às Escrituras; "As pessoas têm perecido sob as ministrações daqueles que 'não negam' a cruz de Cristo. Porém, algo mais que isso é necessário. Deus, envia-nos ministros que, em vez de evitar a negação da cruz, estejam fervorosos pela cruz, cujas vidas sejam sacrifícios vivos de gratidão ao abençoado Salvador que os amou e se entregou por eles!" (pág. 147). 

Por último, a igreja deve combater a ignorância a respeito do cristianismo dentro de seus próprios portões; essa ignorância "é o resultado lógico e inevitável da falsa noção de que o cristianismo é um estilo de vida, e não uma doutrina; se o cristianismo não é uma doutrina, o ensino, obviamente, não é necessário para o cristianismo." (pág. 148); mas, como doutrina, o cristianismo deve ser não só constantemente proclamado, mas também ensinado em suas afirmações e implicações práticas.

"Leigos, assim como ministros, devem retornar, com uma nova firmeza, ao estudo da Palavra de Deus nestes dias." (pág. 149); não ignoramos os muitos perigos enfrentados; mas, apesar das muitas dificuldades enfrentadas, nossa esperança está sobre as promessas preciosas de Deus.
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(1) MACHEN, John Greshan "Cristianismo e Liberalismo" - Shedd Publicações - tradução Caio Cesar Dias Peres - 1ª edição - 2012 

(2) CAIRNS, Earle E. "O cristianismo através dos século" - Ed. Vida Nova - tradução Israel Belo de Azevedo, Valdemar Korker - 2ª edição - 2008 - páginas 466, 484 - 487